Aposto minha mão direita e meu cérebro ( que nem valem tanto) : já, já, começará o grande festival de trocadilhos em reportagens sobre as Olimpíadas.
Faça-se um bolão.
Quantas vezes a expressão "negócio da China" aparecerá em reportagens sobre aquele chatíssimo festival de disputas esportivas que assolarão os vídeos e as páginas dos jornais em agosto ?
a) 50 vezes
b) 75
c) 348
Uma cena típica: o atleta pobrinho ganha uma medalha. Uma voz melosa diz :
"trocar o chão de terra batida do interior do Nordeste pelo pódio de Pequim foi............um negócio da China"
As reticências indicam que haverá uma pausa irritante entre "foi" e "um negócio".
É assim. Sempre foi. E será.
Perdoai-me, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto. Humildemente, eu me ajoelho a vossos pés nesta noite invernal de julho para vos confessar dois pecados :
estava zapeando quando vi, neste momento, meia-noite e meia, um cantor brega de cabelo pintado, brinco na orelha e um imenso rabo-de-cavalo cantando uma música cafoníssima em espanhol. Como se não bastasse o horror visual e auditivo, ele desabotou a camisa e exibiu o peito cabeludo, para parecer "sensual". Chama-se Elimar de Tal.
Nem faz vinte e quatro horas, eu já tinha visto Júnior, aquele irmão de Sandy, dando entrevista na platéia de um show da Família Lima. Um detalhe: ele exibia um corte de cabelo moicano.
Minhas retinas fatigadas jamais se recuperarão do duplo golpe: Elimar de Tal e Júnior de Tal. Dispenso-me de tecer maiores considerações sobre a Família Lima ( o que é aquilo, Deus do Céu ? Uma voz celestial me responde que "Família Lima" é a alcunha de um conglomerado de bípedes que guardam entre si três características básicas : são geneticamente interconectados pelos genes da chatice, usam - ou usavam - rabos-de-cavalo patéticos e vestem-se apropriadamente de luto para arrancar sons insuportáveis de violinos).
Ah, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto: eu me penitencio. A culpa foi minha. Quem mandou ficar zapeando ? Por que não usar este tempo passeando os olhos por um bom livro ? Mas, não. Preferi o risco de usar o controle remoto.
Resultado: confirmei, pela enésima vez, que a Humanidade é inviável.
Noticiário esportivo na TV. De repente, sem aviso prévio, uma figura se materizaliza.
Cabelo cheio de trancinhas. Brinco na orelha.
O que é aquilo ?
É Ronaldinho Gaúcho, crianças. Parem de chorar. Vão tomar um copo de água com açúcar.
O susto passa rápido.
O confrade GMN (quem mandou não estudar ? se tivesse estudado, o bicho estaria hoje exercendo alguma profissão realmente útil, em vez de passar a vida cometendo jornalismo impunemente...) lançou, diante da meia dúzia de leitores deste blog, um ataque contra as praticantes de nado sincronizado.
Devo dizer que discordo.
O ataque não esteve à altura da enormidade do horror que é o nado sincronizado, uma modalidade esportiva incrivelmente admitida nos jogos olímpicos.
Se houvesse justiça no planeta, não apenas os praticantes mas, especialmente, os espectadores do nado sincronizado deveriam ser objeto de asco, pena e desprezo perpétuos por parte de todos os viventes.
O aviso fica dado: todos alertas! As Olimpíadas vêm aí! Protejam as crianças! Cuidado com o nado sincronizado : não deixem que elas sejam surpreendidas pelo espetáculo dantesco daqueles pezinhos se movendo ridiculamente na superfície da água!
1. Em nome de todos os santos, pelo amor de Deus, alguém precisa avisar a repórteres de TV que o trocadilho é o lixo do texto. O maior engano da história do jornalismo - impresso ou televisivo - é imaginar que trocadilhos são capazes de dar "qualidade" a um texto capenga. Não dão. São, em noventa e nove por cento dos casos, infames. Deveriam ser sumariamente banidos, em nome do bem estar dos ouvidos alheios. Mas, não. Transformaram-se em peste televisiva. A saída: tirar o som quando trocadilhistas dão sinal de vida. Ou mudar de canal. Ou, o que é ainda melhor, desligar a TV, que, a bem da verdade, não passa de um eletrodoméstico metido a besta.
2. Pode existir, sob o sol do Brasil, assunto mais chato do que essas discussões infindáveis sobre se Capitu traiu ou não traiu Bentinho ? Não pode. "Se vivo estivesse", Machado de Assis certamente exalaria um suspiro de tédio diante dessas contendas inúteis. Aliás, por que diabos chamam Machado de Assis de "Bruxo" ? Isso é coisa de jornalista desocupado ( ou um deslize de Carlos Drummond, autor de um poema em que recorre ao título maldito ao falar de Machado de Assis)
A esse respeito, louve-se a atitude de Augusto Nunes: não faz tempo, ele notou, no Jornal do Brasil, que jamais, em tempo algum, os moradores dos estados banhados pelo São Francisco chamaram o rio de "Velho Chico". Mas é inevitável: o rio será sempre chamado de "Velho Chico" naquelas reportagens em geral publicadas nas chatíssimas edições dominicais dos nossos jornalões. Alguém já imaginou um morador "ribeirinho" dizendo: "Vou ali tomar um banho no Velho Chico. Volto já! ". Não. É inimaginável.
"Velho Chico" ? "Bruxo do Cosme Velho" ? Trocadilhinhos na TV ? Ah, não.
Rendo-me de uma vez por todas à crença de que não há remédio para a humanidade.
Primeiro, eu desconfiava. Olhava de soslaio para a espécie humana e ruminava: "São todos patéticos - inclusive eu, é claro".
Hoje, a desconfiança evoluiu para uma certeza pétrea, irremovível, irrevogável: tudo não passa de um circo sem sentido, somos todos ridiculamente patéticos, chamamos Machado de Assis de "Bruxo do Cosme Velho" e o Rio São Francisco de "Velho Chico" - e fica o dito pelo não dito. Nenhum raio cai sobre nossa cabeça, nenhuma bomba de hidrogêneo desaba sobre nossas carcaças para animar a festa.
É assim. Sempre foi. Mas, como contrapeso a esse infindável somatório de equívocos, fica o registro de que Luiza Brunet, com todo respeito, continua bonita. E gostosa.
Do blog de Alexandre Soares Silva :
"Jornalismo
Ouvi uma vez Fernando Morais dizer que quem não se interessa por Antônio Carlos Magalhães não devia ser jornalista, devia ir fazer outra coisa. Acho que esse é exatamente o problema com o jornalismo: um monte de gente que se interessa por Antônio Carlos Magalhães. Isso, e que são gentinha. Mesmo pessoas interessantes como Paulo Francis - cuja morte eu quase, quase chorei - quanto mais jornalista era, quanto mais da patota do Pasquim, mais acanalhado. Quem disse o que ele disse sobre Ruth Escobar (sim, ela mereceu) is no bloody gentleman. Vejo a vida de Paulo Francis como uma luta contra o jornalismo. Daí a sua depressão de dias, depois que seu romance não vendeu o quanto queria. Sentia a necessidade de escapar desse mundo acanalhado das redações, e suspeito que queria escapar até mesmo de alguns amigos, que entrarão para alguma espécie de história só porque tiveram a sorte de viver no mesmo bairro de um gênio. No final, se não me engano escrevendo sobre uma exposição de Matisse, Paulo Francis lamentou o tempo que tinha desperdiçado na vida, lendo e escrevendo sobre Kruschev, Jango, e outras bestas. Foi um gênio que viveu na favela do jornalismo. Quis escapar. Morreu antes. E até hoje os jornalistinhas brasileiros reclamam de seu pseudojornalismo - como se importasse se os seus textos seguiam ou não alguma espécie de cartilha infecta do que é jornalismo. Fico imaginando se um chefinho de redação o forçasse a escrever jornalismo de verdade; ah, as almas secas, cheirando a nicotina, que falam de jornalismo como se fosse uma ciência arcana. O que ele escreveu foi simplesmente as melhores linhas do jornalismo brasileiro, e se o jornalismo o renega, fica decapitado.
Mas enfim. De qualquer modo, juro que nunca fui tão feliz quanto depois que acabou a minha assinatura da Folha. Meu rosto ganhou uma distinção encantadora"