É impressão, ilusão de ótica, ou os sites e blogs estão mais animados do que os nossos jornais e revistas ?
Um exemplo ?
Sérgio Rodrigues aplica o seguinte teste de múltipla escolha, no Todo Prosa:
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"Qual é o maior problema da literatura brasileira?
( ) Os escritores não sabem escrever.
( ) Os leitores não sabem ler.
( ) Os críticos não sabem criticar.
( ) Os blogueiros se acham escritores.
( ) Os comentaristas de blog se acham críticos.
( ) Os críticos dos comentaristas de blog se acham.
( ) Os críticos dos comentaristas dos críticos dos comentaristas de blog… hã, onde estávamos mesmo?
( ) Ser brasileira demais.
( ) Não ser suficientemente brasileira.
( ) Não ser literatura.
( ) Literatura brasileira? Onde?
( ) Vai ler um livro e não me enche o saco."
(aqui, o debate entre internautas http://www.todoprosa.com.br/)
Costuma-se dizer que todo tradutor é um traidor. É possível, mas pergunto:
quantos de nossos escritores, particularmente os ficcionistas de má prosa, já não foram beneficiados pela paciente e oportuna recauchutagem dos tradutores, quero dizer, dos traidores lá de fora ?
Joel Silveira, datilografado por GMN
-Como fulano escreve ! Quantos livros você acha que ele publicou ?
-Até a semana passada, devia estar beirando os quinhentos quilos.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Quem é essa tal de Dona Lop ?
Vou dizer já, já. Você a conhece pelo nome, não pelo apelido. Ponto. Parágrafo.
A cada hora aparece um profeta para tentar adivinhar o que acontecerá com os jornais impressos no futuro próximo. A Internet vai matar os jornais de papel ?
Talvez. Não faz tempo, li um artigo que, confesso, provocou um mini-abalo sísmico em minhas certezas interiores: o autor dizia que, na ponta do lápis, os jornais impressos podem caminhar para a inviabilidade econômica.
Pelo seguinte: os anúncios classificados - uma das fontes de renda dos jornais - começam a migrar para a Internet. Os anúncios "propriamente ditos", idem. Os leitores jovens vão direto para o computador. Ao contrário dos pais, não adquiriram o hábito de ler jornais impressos.
É uma questão de matemática. Se um dia não houver dinheiro em caixa para financiar toda a produção, impressão e distribuição de um produto como é o jornal impresso, entrará em cena uma senhora cruel, capaz de exterminar com um gesto todo aquele que ousar perturbá-la: a sra. Lop, também conhecida como Lei da Oferta e da Procura. Nenhum empresário imprime jornal para fazer caridade. Quer ter lucro,óbvio.
Os jornais frequentemente dão a impressão de estarem cavando a própria sepultura. É inacreditável: há anos e anos, repórteres, editores, professores, pitaqueiros, palpiteiros, picaretas e sumidades dizem e repetem, em tudo quanto é congresso de jornalismo, que os jornais não podem se acomodar, não devem simplesmente repetir o que a televisou já noticiou na véspera.
Sempre dizem: se quiserem sobreviver, se quiserem conquistar leitores, os jornais devem investir na grande reportagem, nos textos autorais, no aprofundamento do tema. É um diagnóstico possível. Mas o que os jornais fazem? Com as exceções de praxe, fazem exatamente o contrário. As primeiras páginas se dão ao luxo de repetir, nos títulos, o que noventa por cento do leitorado bem-informado já sabe desde a véspera. Os textos foram uniformizados. Parecem escritos por uma máquina de produção de frases pré-moldadas. A grande reportagem foi revogada. Etc.etc.etc.
Todo este "nariz de cera" ( é assim que se chamavam as introduções intermináveis dos textos de antigamente) para dizer o quê ?
O presidente do New York Times deu uma entrevista dizendo que não sabe se daqui a cinco anos o jornal existirá fora da Internet. A edição impressa pode ir para as cucuias.
"Sinal dos tempos": hoje, o número de leitores da edição on-line já supera o de assinantes da versão impressa.
Já dá para ouvir, claro e nítido, o rumor dos passos da Besta do Apocalipse se dirigindo à redação mais próxima de um jornal impresso com uma foice na mão e uma motossera na outra.
Mas, apocalipse à parte, é mais do que provável que as edições impressas dos grandes jornais sobrevivam, com outro rosto, outra proposta, outro alcance, outro tamanho.
Podem virar um "luxo", consumido por uma minoria, assim como são tantas revistas e tantas publicações que povoam as bancas.
Quem diria: pelo menos no universo de papel, a "grande imprensa" pode virar "alternativa".
O número de acesso aos sites é que determinará a "tiragem" de um jornal.
Se dona Lop mandar, assim será.
(aqui, a entrevista do executivo do New York Times:
http://www.wbibrasil.com.br/boletim.php?id_boletim=308)
Cauê, o mascote do Pan, finalmente se aposentou.
Vai fazer uma falta....
Acabou o Pan. Vêm aí as Olimpíadas de Pequim.
Ah, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, fazei com que os responsáveis pelos jornais, sites, rádios e TV assinem desde já, diante de duzentas testemunhas, um grande acordo nacional para evitar que o público seja obrigado a ler ou ouvir textos espirituosos com a expressão "negócio da China"....
Obrigado, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto: se nosso pedido for atendido, prometemos nos submeter a toda e qualquer penitência, em sinal de eterno agradecimento.
Telegrama de Curitiba: "O senhor está convidado para um debate com os estudantes daqui".
Nem pensar. O que sei eles não sabem. O que eles sabem eu não sei.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Dá-se vaia - municipal, estadual, federal e internacional. Tratar no Maracanã.
Ingmar Bergman morreu. Adolescente, a gente aprendia com ele que o tédio tinha certidão de nascimento: era sueco.
Um teólogo, com tempo disponível para produzir frases ilegíveis em cursos de pós-graduação, bem que poderia escrever uma tese sobre um óbvio efeito da Internet : a dessacralização absoluta do chamado "jornalismo opinativo". Hoje, todo mundo opina sobre tudo na Galáxia Blogueira. Democratizou-se o achismo. A outrora grande platéia se dividiu em milhões de partículas.
Dizei, McLuhan: o que é que sobrará, depois da peneira ?
Sempre que eu telefonava para Noel Nutels, me queixando de uma dorzinha ou de um achaque qualquer, a resposta era invariável:
-Você está consultando a pessoa errada ! Já lhe disse que não sou veterinário.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Não vamos nos enganar: no Brasil, existe mais folclore do que cultura ;mais ativismo "intelectual" do que verdadeira ilustração.
Joel Silveira, datilografado por GMN
O blog ( "altamente recomendável") do escritor Antônio Fernando Borges traz um post sobre o sucesso numérico da literatura Harry Porter:
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"Vendo meu proverbial desprezo por esta literatura estratosfericamente pequena, amigos se apressam em dizer: “Mas se tanta gente está lendo! Alguma coisa de bom deve ter!”.
Eis a questão!
* * *
A razão estatística - que reina absoluta nas votações e dá suporte às democracias - não tem muita validade fora do terreno da política. Nem a Verdade nem as grandes Virtudes, por exemplo, dependem da opinião das “maiorias”.
* * *
Mas se a distorção acontece às vezes até nas cabeças mais esclarecidas, é porque a Ditadura do Consenso já se instalou – em nome da suposta autoridade dos números.
A “golpes de maioria” (a expressão, uma delícia!, é de Rui Barbosa), a tirania se apresenta como Liberdade, e a insanidade como Razão.
* * *
(Será que eles não estão percebendo isto, Tia Anastácia?!!)
* * *
Isso diz muito sobre nosso tempo. Em épocas normais, dizia Aldous Huxley, nenhum indivíduo sadio pode admitir a idéia de que os homens são iguais".
(aqui:http://www.antoniofernandoborges.com/)
Bernardinho, o técnico-carranca, continua solto ?
Ir aos poucos, com lucidez e cálculo, e sem qualquer arroubo, cortando as pontes atás de si: um prazeroso, estimulante exercício.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Sérgio Augusto:
"O e-book ( ou livro eletrônico) é um engodo. Pode funcionar como suporte de pesquisa,igualando-se ao computador, imbatível na especialidade, mas não consigo imaginá-lo veiculando narrativas ficcionais. Entre outras coisas, porque o hipertexto é refém de um paradoxo: se sua capacidade de armazenar palavras é praticamente infinita, não se pode dizer o mesmo de nossa disposição para ler o que quer que seja numa tela. Experimente gramar Guerra e Paz numa edição eletrônica"
(Em "As Penas do Ofício", Editora Agir)
Tenho medo de que no último balanço, que se aproxima, eu chegue a esta arrasadora conclusão: não teria sido tudo um grande, patético equívoco ?
Joel Silveira, datilografado por GMN
Pausa para um minuto de Sessão Nostalgia : era uma vez uma banda britânica chamada Badfinger. Apadrinhada pelo beatle George Harrison, fez sucesso nos anos setenta com músicas como "Day After Day". Um empresário gatuno passou a mão no dinheiro da banda. Para encurtar a história:
o líder da Badfinger, Pete Ham, enforcou-se em abril de 1975. Deixou um bilhete dizendo que o empresário, Stan Polley, era "um bastardo sem alma".
Oito anos depois, o parceiro de Ham na banda, Tom Evans, também se enforcou, no quintal de casa. Em outubro de 2005, Mike Gibbins, ex-integrante do Badfinger, morreu dormindo. Só restou um para contar a história, o guitarrista Joe Molland.
Em "Day After Day", o padrinho George Harrison toca guitarra.
Harrison morreu em novembro de 2001.
Assim caminha a humanidade.
Por que a lembrança fora de hora do Badfinger ? É que o navegador que vos fala tropeçou em imagens do grupo no You Tube, a primeira TV planetária.
Os frequentadores - habituais ou acidentais - desta senzala haverão de lembrar que, não faz tempo, o Sopa de Tamanco revelou a chave de todos os segredos. Toda vez que você se sentir ameaçado por alguma calamidade, pronuncie a senha mágica "Klatoo Barada Nikto". A ameaça se evaporará a olhos vistos ( aos que chegaram depois do início do filme :"Klatoo Barada Nikto" é a senha que, pronunciada diante de um robô alienígena, evita a destruição do planeta no filme "O Dia em que a Terra Parou", clássico meio trash na ficção científica).
Nunca esta senha foi tão necessária quanto nestes dias invernais.
A partir de agora, toda vez que uma autoridade tentar justificar a zona aérea com frases pretensiosamente espirituosas, comparações infelizes, metáforas desastrosas, pronuncie a senha diante da TV ou da página aberta do jornal: "Klatoo Barada Nikto !". Pode ser em voz baixa. Ou aos gritos.
Se todos repetirem o mantra, um dia os alienígenas entenderão a mensagem.
O abaixo assinado usou a senha, com bons resultados. Quando uma atendente de uma empresa aérea disse que iria "estar transferindo" a ligação, passei a repetir mecanicamente "klatoo barada nikto", "klatoo barada nikto" ,"klatto parada nikto".
Do outro lado da linha, ouvi, claro e nítido, um relincho que dizia "não estou entendendo, señor; pode repetir ?... "
Continuei repetindo. E assim se passou uma tarde no Cone Sul da América.
Uma cena me chamou atenção no dia em que a seleção brasileira levou um baile da seleção francesa na Copa do Mundo de 2006:
quando o jogo já se aproximava daqueles instantes dramáticos,nos quinze minutos finais do segundo tempo, a câmera mostrou a imagem do técnico Parreira. Qualquer outro brasileiro estaria botando o coração pela boca ( vide o que faz Scolari), porque o time estava a minutos da eliminação. Mas Parreira ( técnico competente porque ganhou uma Copa em 94 com um time apenas razoável) exibia um ar pétreo, distante, germânico, impassível. Uma atitude que não soava nem um pouco brasileira. Quem disse que a frieza um técnico não contamina também o time dentro de campo ?
Agora, uma cena parecida,colhida pelas câmeras não durante uma derrota, mas uma vitória, causa igual estranheza:
quando a seleção de vôlei fez o ponto que ganrantiu a conquista da medalha de ouro no Pan, as câmeras procuraram o rosto do técnico Bernardinho. E lá estava ele, com ar pétreo de quem estava testemunhando um velório.
Acorda, Freud! Dai-nos uma explicação.
Há qualquer coisa de errado nestas tentativas de adotar, em situações-limite, uma atitude que não combina em nada, nada,nada, para o bem e para o mal, com o Brasil.
Quando quer parecer que não é machista, o Brasil mete os pés pelas mãos. Um ministro recém-nomeado declara que só aceitou o cargo porque a mulher mandou. Um senador diz que só voltou trás da decisão de renunciar a um cargo na comissão de ética porque a mulher quis assim. O presidente, quem não se lembra ?, levava a mulher para reuniões técnicas, numa cena constrangedora. O que ela estava fazendo ali ?
As três cenas são patéticas.
Se uma mulher anunciasse ao país que só aceitara ser nomeada para um cargo de primeiro escalão do governo porque o marido mandou,
seria chamada de quê ?
Com toda certeza, seria chamada de pamonha, frouxa, vaca, indecisa.
Por que com os homens não é assim ? Por que, quando um homem público confessa que é um pamonha diante da mulher, também não desperta os (merecidos) risos de escárnio ?
O motivo é o seguinte : país machista tolera perfeitamente pamonhices cometidas por homens. Os paus mandados sabem que, ao confessarem de público que são paus mandados, não cairão no ridículo. Pelo contrário : terminarão vistos como "anti-machistas".
Mas o que, à primeira vista, parecia ser um gesto anti-machista na verdade é a consagração máxima do machismo.
A certeza de que não levarão vaias e ovos é que faz estes cavalheiros confessarem de público que só fazem o que as respectivas mulheres mandam.
Independentemente de crença, competência, filiação partidiária e seja lá o que for, deve-se desconfiar imediatamente do homem que diz que só faz o que a mulher quer.
Isso é patético. Patético. Patético.
(O vexame público se repete na chamada "esfera privada". Já ouvi, com esses ouvidos que as labaredas do crematório um dia vão consumir, o telefone de um profissional ( competente) tocar de meia em meia hora durante uma viagem de trabalho. Era a mulher, preocupada em monitorá-lo à distância. Perdi a confiança na competência do bicho. O pior é que gente assim trata a submissão à mulher como se fosse "virtude").
Repito : só em um país cem por cento machista um homem se declara escravo da mulher sem ter medo de cair para sempre, por todos os séculos, no mais absoluto ridículo.
Capto no ar, claras e nítidas, as vibrações de um rugido desalentado. Como se fosse um índio, colo o ouvido ao chão. Consigo decifrar de onde vem o rugido: é o Brasil emitindo um suspiro de tédio a cada hora que aparece um senador fazendo malabarismos com uma máquina imaginária de calcular nas mãos. Pensa que engana a platéia do circo.
"Ufa.....".
O desagradável no suicídio é que o corpo raramente tomba numa posição decente.
Joel Silveira, datilografado por GMN
O drama íntimo de todo autor - seja ele o mais obscuro teclador de blog, seja ele a mais festejada sumidade das letras - é começar bem um texto.
O leitor é aquele animal nômade que escapa para outro território se não for fisgado na quinta linha.
Ok : pode ser na sexta.
Que tal a abertura desta reportagem, publicada por Ernest Hemingway na revista Esquire ( e traduzida no Brasil na coletânea "Tempo de Viver") ?:
"Se alguma vez tiver de abater um cavalo, coloque-se tão perto dele que não possa falhar o tiro e alveje-o na testa, no ponto exato de interseção de uma linha traçada da orelha esquerda para o olho direito e de uma outra da orelha direita para o olho esquerdo. Uma bala de pistola calibre 22 colocada neste ponto matará o animal instantaneamente e sem dor"
Ficou pronto o projeto para a criação do trem bala entre São Paulo e Rio. Preço: 17 bilhões de reais. A viagem por terra entre as duas cidades poderá ser feita num piscar de olhos : 85 minutos.
Que bom.
Há, óbvio, um preço extra a pagar : diante do tamanho da obra, as empreiteiras - envolvidas em dez de cada dez casos de corrupção - devem estar esfregando as mãos, soltando fogos (superfaturados, claro) e babando na gravata.
É só dar uma vasculhada nos arquivos : não há roubalheira de grande monta em que não esteja atolada até o pescoço uma dessas empreiteiras que usam propina como ingrediente de cimento. Há décadas e décadas é assim.
Se um investigador com cachimbo e cachecol quadriculado sobre os ombros ordenasse algo como "procurem os suspeitos de sempre", lá estariam, na primeiríssima fila, donos, diretores e, especialmente, tesoureiros de empreiteiras; congressistas e governantes. Noventa e cinco por cento dos casos seriam resolvidos.
Vejam-se os túneis de São Paulo. Quem pagou aos corruptos ? As empreiteiras, claro.
Mas justiça se faça: há algo menos confiável do que elas.
Faça as contas:
Em que você confia menos?
a) uma cédula de dezessete reais e meio
b) o mugido de um boi da fazenda do presidente do Senado
c) as lágrimas de Joaquim Roriz
d) o orçamento de uma empreiteira para uma obra pública
É perda de tempo: Vossa Senhoria não vai encontrar um blog mais variado, mais atualizado e mais atento do que este.
Pode conferir.
Aqui no Sopa de Tamanco, Vossa Senhoria será sempre encaminhada para os melhores blogs ( vá, mas faça o favor de voltar). Conhecerá com quantos paus se dá uma tamancada. Nossas antenas estão ligadas dia e noite.
Então, neste momento grave da vida nacional, o Sopa de Tamanco convoca os tamanqueiros a botar a boca no trombone: toda propaganda é pouca.
Se cada internauta trouxer outro para visitar o Sopa de Tamanco, em breve o Brasil sairá do fundo do poço.
Palavra do Comitê Central.
Pergunto eu: sob o ponto de ecológico e levando em conta o equilíbrio do meio ambiente, o que é mais necessário? Um urubu ou um cantor baiano ?
Joel Silveira, datilografado por GMN
Confirmado pelas agências de notícias: a Soul Funk, banda que acompanha Júnior, o irmão de Sandy, foi desfeita.
Vai fazer uma falta.....
Sérgio Augusto:
"Não tenha dúvida: a mídia é a maior responsável pela patética e jeca vassalagem a celebridades que, a partir da década de 1990, virou um flagelo mundial. O jeca é uma cortesia de Paulo Francis, que sentia furibundo desprezo pela fama imerecida, por celebridades forjadas pela mídia, criaturas que são-famosas-porque-sçao-famosas, que nada fizeram de meritório para o destaque que a imprensa lhes dá. Ou então fazem coisas que a imprensa, por uma questão de decoro, deveria ocultar de seus leitores ( Se você pensou em Narcisa Tamborindeguy e quejandos, meus parabéns). "Sabe porque os editores de jornais e revistas dão tanta luz a essa gentalha ? ", comentou comigo Paulo Francis, pouco antes de morrer. "Porque todos eles, com raras exceções, são jecas e deslumbrados, que ainda ontem só andavam de ônibus, vestiam terno da Ducal, achavam o fino tomar vinho rosé e comeram o seu primeiro patê aos vinte e cinco anos".
(Trecho de "Assim Rasteja a Humanidade", artigo publicado no livro "As Penas do Ofício", Sérgio Augusto, Editora Agir. Bela leitura).
É tradição, blá-blá-blá-blá-blá-blá, mas, com toda honestidade, existe coisa mais ridícula do que um ator virar para outro numa noite de estréia e dizer "merda!" para desejar boa sorte ?
Quem foi o merda que inventou essa história ?
Imagine-se a cena em outra situação: um repórter se vira para o editor na hora do fechamento de uma página e diz : "Merda! "
Um médico olha para o ventre aberto de um paciente na hora da operação e exclama para o assistente: "Merda!". Um piloto encara o co-piloto na hora da decolagem e suspira: "Merda!".
Receberiam voz de prisão na hora.
Um belo dia, você, coberto de trapos, com a voz trêmula, apoiado num cajado comprado em Islamabad, tentará reunir jovens aspirantes ao jornalismo à sombra de uma árvore, numa cidadezinha do interior do Brasil, para contar vantagem a eles.
Ninguém prestará atenção, é claro. Você,então, se dirigirá para o melhor de todos os ouvintes : o vento (acabo de cometer uma injustiça : o melhor de todos os ouvintes é a parede. Mas tudo bem).
Contar vantagem para o vento e as paredes é o que faz todo dinossauro que se preze. Você, íntimo do vento e das paredes, segue adiante.
Tenho uma vantagem a contar : já vi um jogo da seleção brasileira, diante da TV, em companhia do grandesíssimo cronista Nélson Rodrigues. Detalhe : um minuto antes do começo do jogo, Nélson Rodrigues não sabia contra quem a seleção ia jogar. Quando a TV repetiu um gol da seleção, ele pensou que o placa já estava dois a zero.
Assim:
"Nélson parece distante da disputa que se desenrola,ali,diante de nós,no vídeo da TV,entre a seleção brasileira e o escrete peruano. Faz ao repórter uma pergunta incrível : “Quem é o nosso adversário hoje ? “. Informo que é o Peru.
Fique registrado para a posteridade que o maior cronista do futebol brasileiro não precisava necessariamente saber quem era nosso adversário.
Quando Zico faz um a zero,aos trinta e quatro minutos do primeiro tempo,Nélson interrompe a entrevista para inaugurar,aos brados,uma nova expressão exclamativa :
- Que coisa beleza ! Que coisa beleza !
Depois,pede à família : “Pessoal,com licença dos nossos visitantes,vamos fechar essa máquina porque já estou começando a ficar nervoso”. Aos não iniciados nas sutilezas do dialeto rodrigueano, esclareça-se que “fechar a máquina” significa desligar a televisão – o que,aliás,não foi feito. Nélson dispara,então,um julgamento entusiasmado sobre o escrete dirigido por Cláudio Coutinho :
- Mas esses rapazes são uns gênios ! Uns gênios !
O repórter seria novamente surpreendido. Nélson já perguntara quem era “nosso adversário”. Agora,ao ver o replay do gol recém-marcado, toma um susto : “Mas já houve dois gols ? “. Digo a ele que não : é apenas a repetição do primeiro gol. O placar é um a zero. O gênio da raça concorda com um “ah,sim !”. Teria dois outros motivos para vibrar : o mineiro Reinaldo – que entraria no lugar de Nunes - faria dois gols,aos 20 e aos 40 minutos do segundo tempo,para fechar o placar : Brasil 3 x O Peru.
(Corro à banca no dia seguinte para comprar o jornal. O que diabos Nélson Rodrigues teria escrito sobre o jogo que eu não o deixara ver ? Eis :
- Vejam vocês como o futebol é estranho – às vezes maligno e feroz.Mas não quero ter fantasias esplêndidas.O jogo Brasil x Peru,ontem,no Mário Filho,não assustou a gente.Diz o nosso João Saldanha : “O Brasil fez seu jogo,jogo brasileiro”. Vocês entendem ? Não há mistério.O brasileiro é assim.Quando um de nós se esquece da própria identidade,ganha de qualquer um.Outra coisa formidável : na semana passada,um craque nosso veio me dizer : “Nélson,é preciso que você não se esqueça : ao cretino fundamental,nem água”. O jogo foi lindo”.
Penso com meus botões que Nélson não precisou esperar pelo início do jogo para escrever a crônica. Com certeza, despachou o texto para o jornal antes da chegada do repórter intruso. Os “idiotas da objetividade” se encarregariam de registrar,nas páginas esportivas,o jogo real. Porque o jogo de Nélson seria lindo de qualquer maneira. E aos cretinos fundamentais ? "Aos cretinos fundamentais, nem água".
(Aqui, o texto completo: http://www.geneton.com.br/archives/000012.html)
Os criadores daquele anúncio de cerveja que fala em "é ponto" - assim como seus parentes em primeiro, segundo e terceiro graus, a recepcionista, o motorista, os contínuos e os diretores da agência que criou a campanha - continuam soltos ?
É não só pitoresco como também esquisito: no Brasil, todo sociólogo é economista e todo economista é sociólogo.
Conheço um agrimensor que quer ser Ministro da Justiça.
Joel Silveira, datilografado por GMN
A zona aérea terminou ofuscando o escândalo do Senado. É injusto.
Que ninguém se esqueça dos bois do presidente do Senado.
Continuam mugindo, à espera de quem os explique.
Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, nós, humildes servos, postados a vossos pés, perguntamos: pode existir na face da terra
coisa pior, mais desqualificada e mais insuportável do que aquela Banda Calypso ? Vosso servo outro dia ouviu no rádio. Como é que alguém consegue cantar daquele jeito ? Que importa, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, que a banda faça "sucesso" ? Aqui em nossa República Verde-Amarela do Atlântico Sul, aliás, virou moda justificar tudo com números. Dizem que, se a banda vende milhares de CDs e se lota shows, então deve significar alguma coisa. Não significa, não, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto. É lixo em quantidade industrial. Lixo. Lixo. Lixo. Em nome de princípios politicamente corretos e esteticamente indefensáveis, os cultuadores de lixo como a Calypso estão implantando o chamado "relativismo cultural". Ou seja: tudo é defensável, tudo é valioso, tudo é bom, tudo é interessante. Não existiria lixo, não existiria tosqueira, não existiria horror, não existiria despreparo. O problema é que existem, sim. Então, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, nossos ouvidos e nossas retinas querem dizer apenas uma palavra: não.
Jamais consegui me alegrar com o lúgubre hino de Sergipe, embora ele comece assim: "Alegrai-vos, sergipanos...."
Joel Silveira, datilografado por GMN
São irrerversíveis os efeitos colaterais que pode causar a indiscriminada produção de má literatura.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Três empregos no mundo me matam de inveja : o de Papa, o de presidente da Fifa e o de diretor-geral do Louvre.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Justiça se faça : o QI dos senadores é altíssimo.
O QI: Quociente de Imoralidade.
Como todo palhaço velho, sempre sonhei em ver o circo pegar fogo.
Acho que vou conseguir.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Tom Jobim (acho que era ele) dizia que a saída para o Brasil era o aeroporto.
Não é não.
A verdade é que nunca vi no circo um gato fazer as disciplinadas tolices que um leão faz.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Um piloto, em plena atividade, aparece no telejornal de maior audiência do país, o Jornal Nacional, edição de sábado passado, para dizer, com todas as letras, que a pista do mais movimentado aeroporto do Brasil,o de Congonhas, "não segura" avião em dia de chuva.
Repita-se :"Não segura".
Nunca se viu aviso tão claro.
O Brasil poderia oferecer ao mundo uma nova figura jurídica: o conceito de "culpa coletiva" dos governantes.
Já se disse que o subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos.
A incompetência também: não nasce da noite para o dia.
O Brasil não tem competência gerencial.
É simples assim: todos os presidentes, todos os governadores, todos os prefeitos são, sim, culpados por cada vida estupidamente perdida em tragédias como esta de Congonhas.
A estupidez vai além dos aviões de carreira. Por que ninguém nunca se preocupou - por exemplo - em dotar o Brasil de uma rede de transporte ferroviário ? Por que jogaram os trens no lixo ? Por que preferiram optar pelas estradas mas permitem que elas se transformem em crateras intransitáveis ? Por que deixaram que a cidade de São Paulo cercasse aos poucos o Aeroporto de Congonhas, a ponto de um posto de gasolina funcionar a metros da pista ? Por que gastaram milhões para transformar os aeroportos em shopping centers mas se descuidaram do principal ?
A lista daria para encher uma enciclopédia. É cansativa. É estúpida. É chata.
Mas passa por todos os níveis: municipal, estadual, federal.
O veredito para todos é simples: culpados. Ponto.
Há uma grande coincidência entre o Brasil e a pista do Aeroporto de Congonhas: nenhum dos dois tem área de escape.
Curioso.
Conviver com o fracasso como se fosse um sucesso. Muitos conseguem.
Como eu os invejo !
Joel Silveira, datilografado por GMN
Para que se saiba como ando em matéria de amizade, basta dizer que já perdi de vista o meu amigomais próximo.
Joel Silveira, datilografado por GMN
a) "Imagine"
b) "Garota de Ipanema"
c) "Asa Branca"
d) "Carinhoso"
Qual dessas será a trilha sonora do inferno ?
O site da BBC Brasil exibe imagens de um robô que os japoneses criaram : a máquina imita os movimentos de uma criança.
Ah, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, respondei : cópia de criança ? Para quê ? Já não basta o original ?
(aqui: http://www.bbc.co.uk/portuguese/)
Passei anos e anos procurando levar este país a sério, para, no final das contas ( e da vida), chegar à conclusão de que tudo não passou de uma estúpida perda de tempo.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Ivan Lessa, direto de Londres:
"Que temos nós contra o celular?
Resposta simples: não é só implicância com essas pessoas todas falando tolices com aquele ar idiota pelas ruas, aparentemente em animado papo com elas mesmas, como se fossem, não só tolas, mas também loucas varridas.
Sabemos, conforme as pesquisas e o bom senso ditam, que 98% de todas as chamadas são absolutamente inúteis, desnecessárias, queimação de dinheiro.
Sabemos mais – e nesse ponto reside nossa atitude superior --, muito mais.
Sabemos que esse papo todo é a maneira da humanidade dar o seu grito de solidão, proclamar às margens de suas dependências o insuportável de seu silêncio interior, a falta de assunto de sua alma".
(Aqui, o texto completo :http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/07/070723_ivanlessa.shtml)
O confrade explica-se:
- Burro não sou. Uma besta quadrada, talvez.
E arremata:
-Um dia, você irá saber a profunda diferença que existe entre uma coisa e outra.
Joel Silveira, datilografado por GMN
O mundo ideal seria aquele em que não houvesse qualquer notícia. Um mundo sem manchetes. Que beleza!
Joel Silveira, datilografado por GMN
Passei anos e anos procurando levar este país a sério, para, no final das contas ( e da vida), chegar à conclusão de que tudo não passou de uma estúpida perda de tempo.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Nunca fui o que se chama de "rato de Internet". Mal sei operar os instrumentos de um blog. Mas, depois de uma zapeada aleatória por blogs & sites, levanto a mão lá na última fila e pergunto ao professor :"É impressão minha ou, com as exceções de praxe, os blogs estão mais vivos, mais interessantes, mais legíveis e mais bem-humorados do que os nossos jornais ?"
A revista "Veja" informa que Xuxa assinou contrato com uma produtora para fazer dois filmes. Ponto. Parágrafo.
Vá ao banheiro. Poste-se diante do espelho. Agora, mire o fundo de seus olhos. Pergunte a si mesmo: você seria capaz de pagar ingresso para ver o filme de uma velhota saltitante que entupiu os peitos de silicone para parecer "sexy" ? Você levaria seus filhos ? Você convidaria um conhecido ?
Pense dez vezes antes de responder.
O "sim" é o fundo do poço.
Depois não diga que não avisei.
Ah, o desprezo e o sonolento tédio com que os gatos nos olham....
Joel Silveira, datilografado por GMN
Os números não mentem jamais ( a não ser, claro, quando saídos da boca de economistas,ministros, banqueiros, supostos garanhões e assessores de imprensa de gravadoras). O Sopa de Tamanco resolve, então, quebrar de público o sigilo blogal : em um mês - entre 20 de junho e 20 de julho - nosso contador de acessos registrou 18.451 visitas!
Dá para encher um estádio de porte médio.
Uma dúvida devastadora invadiu as águas internas dos tamanqueiros no momento em que eles se preparavam para acender os fogos de artifício: é muito ? é pouco ? é um sucesso ? é um fracasso ? vai ter futuro ?
Um blog cem por cento independente, depauperado, sem qualquer vinculação com os grandes portais ( onde contaria com uma grande leva de visitantes "inerciais"), deve, afinal, comemorar as 18.451 visitas ou derramar lágrimas de esguicho na paisagem circundante?
Uma voz não identificada devolveu tudo aos seus devidos lugares:
"18.457 visitas ! Vocês sabem o que este número significa ? Nada! Ene-a-dê-a : nada !"
Os tamanqueiros voltaram para suas respectivas estrebarias, cabisbaixos, mas com sorriso discreto desenhado no canto dos lábios.
E a noite de sexta caiu sobre a república.
É até bom que o brasileiro não tenha memória ou a tenha curta. Lembrar para quê ? Lembrar o quê ?
Joel Silveira, datilografado por GMN
De Nestor de Holanda, em "A Ignorância ao Alcance de Todos" ( livro comprado por sete reais num sebo):
"Quando esteve no Brasil, pela última vez, o poeta Nicolás Guillén concedeu entrevista a uma TV de São paulo. E o locutor:
-Telespectadores, aqui está o grande vale Henrique Guílhem...
Perguntou ao poeta:
-Seu Henrique, é "Guílhem" mesmo que se pronuncia seu nome ?
O poeta, serenamente:
-"Guílhem" passa, amigo. Agora, o "Henrique" é que se pronuncia Nicolás.
Passei a desconfiar de quem não tem menos de cinquenta anos.
Toda juventude é caótica, tomda mocidade é vigarista - mas toda maturidade é cínica e inescrupulosa.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Ah, o enorme descaramento com que dez entre dez brasileiros dão palpites seguríssimos sobre todo e qualquer assunto, como se fossem especialistas com pós graduação em cinco universidades estrangeiras.
Sociólogos de botequim, correi : eis aí um traço do caráter nacional, à espera de um intérprete.
Vivemos todos na República Federativa do Palpite.
Um avião caiu ?
Todo mundo passa a discursar com absoluta segurança sobre extensão da pista, aderência ao solo, escoamento de água, velocidade no pouso.
Só existe um bicho capaz de pontificar sobre todo e qualquer assunto com a desfaçatez de um brasileiro típico:
jornalistas !
Mas estes, é claro, não podem ser classificados como humanóides.
Pertencem a uma espécie animal que os zoólogos ainda não conseguiram identificar.
A edição de domingo do jornal O Estado de S.Paulo, "Estadão" para os íntimos, é uma das (poucas) coisas boas da imprensa brasilíndia, porque investe, por exemplo, em grandes reportagens. Tive a péssima idéia de fazer uma assinatura de fim-de-semana do jornal. Ou seja: somente para os sábados e domingos. Fui obrigado a cancelar a mini-assinatura porque o Estado de S.Paulo deve ter escolhido a pior empresa de entrega do Cone Sul para fazer este serviço no Rio de Janeiro. Perdi a conta de quantas vezes fiquei a ver navios. Péssimo serviço. Chega. Basta.
Pior do que o serviço de entrega carioca do Estado de S.Paulo só a campanha publicitária do jornal. O que é aquilo, meu Deus do céu ? Quem foi o gênio que inventou aquele slogan que diz que o Estadão é o jornal de quem "pensa Ão" e não de quem "pensa Inho" ?
"Pensa Inho" ? "Pensa Ão" ?
O slogan pretensamente criativo soa como a tricentésima tentativa de publicitários de criar pseudo-bordões que nunca, jamais, sob hipótese alguma, cairão na chamada "boca do povo".
Porque somente um idiota em último grau seria capaz de falar assim : "Fulano desistiu de viajar. Acho que ele pensa inho". Ou: "Sicrano pediu demissão do emprego. Acho que ele pensa ão".
(Parece até aqueles anúncios de cerveja supostamente engraçadinhos, mas na verdade ridiculamente patéticos e irritantes, como os que falam em "bar da boa" e "ponto").
O triste é que publicitários vivem dizendo, a sério, que os anúncios brasileiros estão entre os melhores do mundo.
A gente fica imaginando: se é assim no Brasil, como não será no Paraguai, no Sudão, em Angola, na Bolívia ?
O patetice do "ão" e "inho" me lembra de uma das maiores aberrações impressas que já vi: por coincidência, um anúncio do próprio Estado de S.Paulo, publicado há anos na revista "Imprensa", trazia, clara, indiscutível, indesmentível, uma vírgula entre sujeito e verbo. Não me lembro qual era a frase inteira, mas havia, com cem por cento de certeza,uma vírgula entre a palavra "Estadão" e o verbo, no slogan publicitário.
Fiquei pensando: se uma agência de publicidade cria e um grande jornal aprova um anúncio que traz o mais primário dos erros, a caminhada da língua rumo ao brejo é irreversível. Já se disse que tratar a língua a pontapés é o primeiro sinal
da falência generalizada. Deve ser. Um advogado analfabeto querendo escrever difícil; um cantor de pagode; um artista que usa bandana ou tiara; um praticante de badminton; gente assim pode cometer gigantescas vírgulas entre sujeito e verbo, mas quem usa a língua como instrumento diário de trabalho não pode.
Eu me lembrei dessas aberrações publicitárias ao ver, esta semana, um anúncio de página inteira da Associação Brasileira de Propaganda ( publicado, por exemplo, na edição de terça-feira de O Globo). O texto principal dizia: "Quem não evoluiu como o consumidor, se limitou a ficar velho como a censura". Lá estava de novo a vírgula entre sujeito e verbo. Não sou, óbvio, especialista em língua portuguesa, devo cometer minhas barbaridades, mas se o sujeito é "quem não evoluiu como o consumidor", então não existe esta vírgula. Um anúncio assinado pela Associação Brasileira de Propaganda....
Diante do festival de pretensão descabida, erros primários e tentativas desastrosas de fazer gracinha, pergunta-se : por que é que a publicidade brasileira não apaga tudo e começa do zero ?
Eis, aí, o tema de uma boa campanha : "Brasil : chegou a hora de começar do zero !".
É pule de dez: quem entra num sebo sai menos burro.
Eu diria que é tecnicamente impossível percorrer as prateleiras de um bom sebo sem que se descubra pelo menos uma preciosidade. Não sou rato de sebo. Mas, sempre que fui a um desses depósitos de livros descartados, terminei recompensado. Num sebo, descobri uma vez um exemplar puído de um grandesíssimo livro: "O Nariz do Morto", obra-prima de Antônio Carlos Vilaça, agora relançado ( é leitura "obrigatória").
A visita casual a um sebo me fez descobrir o registro de um recorde mundial: o dia em que um redator cometeu dois erros em uma só letra !
Eis o que conta Nestor de Holanda, em "A Ignorância ao Alcance de Todos", livro de 1963 que comprei por sete reais num sebo:
"Max Gold, repórter lítero-recreativo, e,como se sabe, pai do verbo analfabetizar, tem a subida honra de ser recordista mundial de erro em português. Não poderia mesmo deixar de pertencer-nos esse título, para que a CBD junte mais uma taça às de balípodo, bola ao cesto, tênis, peso-galo, salto-tríplice, iate etc.
O recorde, que os coluneiros sociais insistem em conservar na forma inglesa record, foi batido quando o beletrista em foco era divulgador da Rádio Guanabara. Enviou notícia aos jornais, afirmando:
"A programação é á seguinte...."
Errou, assim, duas vezes, numa letra só, o que jamais foi conseguido por qualquer outro campeão:
1.O "a" em questão não é craseado;
2.Crase é acento grave e ele usou agudo"
Registrando esse episódio glorioso, que haverá defigurar, com letras douradas, no livro de ouro da Campanha Nacional de Analfabetização, mostro ao leitor que possuímos admiráveis craques da luta contra a crase, a ponto de, assim como exportamos craques de pebolismo, podermos exportar os de crasismo, para o mundo inteiro"
(em breve: outras histórias da antologia)
É sério: perdi a fé na espécie humana quando, ainda na escola, soube que setenta por cento do corpo humano são feitos de água.
O ser humano não passa de um aglomerado de água ambulante (AAA).
Patético.
A ministra Dilma Rousseff acaba de declarar na TV que não vai dizer onde será construído o novo aeroporto de São Paulo.
O Brasil dá uma nova contribuição ao mundo : o primeiro aeroporto secreto do planeta !
Atenção, bandeirantes : se ouvirem ruídos frequentes de escavadeiras perto de casa, tratem de avisar imediatamente aos jornais. O barulho das máquinas pode ser indício de um novo aeroporto.
Todo mundo já ouviu falar de OVNI. Mas é a primeira vez que se fala em Aeroporto Não Identificado.
Pra frente, Brasil !
Um escritor americano já disse que fazer listas é uma das atividades preferidas pelos seres humanos. Faz-se lista para tudo, seja na hora de ir ao supermercado; seja na hora de enumerar os pecados que serão confessados no Juízo Final.
Um dos blogueiros do Sopa de Tamanco, Paulo Polzonoff, fez uma lista original: indicou quem são os "treze autores celebrados" que não dizem "absolutamente nada" a ele.
A lista de Polzonoff:
1. Hemingway 2. Nelson Rodrigues 3. Dalton Trevisan 4. Rubem Fonseca 5. Rubem Braga 6. Clarice Lispector 7. Drummond 8. Autran Dourado 9. Tolkien 10. Sartre 11. José Lins do Rego 12. Leminski 13. L.F. Veríssimo
( Aqui:
http://www.polzonoff.com.br/)
Eis um bom exercício.
"Acordo para a morte.
Barbeio-me,visto-me, calço-me.
É meu último dia: um
dia cortado de nenhum pressentimento.
Tudo funciona como sempre.
Saio para a rua. Vou morrer.
(...)Pela última vez miro a cidade.
Ainda posso desistir, adiar a morte,
não tomar esse carro. Não seguir para.
Posso voltar, dizer: amigos,
esqueci um papel, não há viagem,
ir ao cassino, ler um livro.
Mas tomo o carro. Indico o lugar
onde algo espera. O campo. Refletores.
Passo entre mármores, vidro, aço cromado.
Subo uma escada. Curvo-me. Penetro
no interior da morte.
A morte dispôs poltronas para o conforto
da espera. Aqui se encontram os que vão morrer e não sabem.
Jornais,café, chicletes, algodão para o ouvido,
pequenos serviços cercam de delicadeza
nossos corpos amarrados.
(...) Vivo
meu instante final e é como
se vivesse há muitos anos
antes e depois de hoje
uma contínua vida irrefreável,
onde não houvesse pausas, síncopes, sonos,
tão macia na noite é esta máquina e tão facilmente ela corta
blocos cada vez maiores de ar.
(...) Sou um corpo voante e conservo bolsos, relógios, unhas,
ligado à terra pela memória e pelo costume dos músculos,
carne em breve explodindo.
Ó brancura, serenidade sob a violência
da morte sem aviso prévio
(....) golpe vibrado no ar, lâmina de vento
no pescoço, raio
choque estrondo fulguração
rolamos pulverizados
caio verticalmente e me transformo em notícia"
(Carlos Drummond de Andrade, "Morte no Avião" - trecho)
Quando entrevistei o escritor britânico J.G. Ballard, ele deu uma declaração que poderia até parecer "politicamente incorreta" : confessou que uma de suas leituras favoritas não era nenhum grande clássico, nenhum dos livros que ocupam as atenções dos críticos e acadêmicos. Um dos seus "favoritos de todos os tempos" era um livro que trazia, simplesmente, a transcrição das gravações das caixas-pretas de acidentes aéreos. O livro, organizado por um americano fanático pelo assunto, chama-se "The Black Box". O autor: Malcolm MacPherson.
Ballard, autor de "O Império do Sol", o livro que deu origem àquele filme de Steven Spielberg, deve ter vibrado ao descobrir que existe, na Internet, um site que não apenas traz a transcrição dos diálogos, mas reproduz as gravações.
Que atire a primeira pedra quem, em terra, não imagina: o que o piloto terá dito no último momento ?
O impacto dos aviões contra as torres do World Trade Center foi tão devastador que nem as caixas-pretas escaparam. Mas o registro das últimas palavras ditas na cabine de dezenas de outros vôos acidentados escapou, intacto.
Como tudo neste planeta, foi parar na Internet.
Aqui: (É só clicar no ícone http://www.planecrashinfo.com/lastwords.htm)
O túmulo de João Paulo II é um dos pontos mais visitados do Vaticano.
Não resisti à curiosidade: numa viagem de férias, entrei na fila para ver. (Confesso que sou ateu amador. Ou seja: ainda não me decidi cem por cento a seguir a profissão de incréu. Só sou crente fervoroso quando estou a bordo de um avião. Em terra firme, cedo à tentação da descrença. Mas reconheço que uma visita ao Vaticano é capaz de acender uma fagulha de crença) .
O clima é de contida comoção diante do túmulo de João Paulo II : fiéis derramam lágrimas discretas, se ajoelham, fazem o sinal da cruz. Aquela imagem do rosto do Papa se contorcendo de dor numa janela do Vaticano parece ressurgir. Turistas não resistem à tentação de fazer pose para uma foto em frente ao túmulo, bastante despojado, aliás. Logo em frente, outro túmulo, o de João Paulo I, também exibe um despojamento franciscano. A imponência ofuscante de outros ambientes do Vaticano - como a Capela Sistina, por exemplo - não se repete no subsolo, onde estão os túmulos dos papas.
Agora, para matar a curiosidade de quem não pode ir a Roma, o Vaticano acaba de instalar uma webcam diante do túmulo de João Paulo II.
Vinte e quatro horas por dia. Ao vivo. A Internet chega ao subsolo da Igreja Católica:
(É só clicar no ícone
http://www.vaticanstate.va/IT/Monumenti/webcam/index?cam=webcam2&testo=Tomba%20di%20Giovanni%20Paolo%20II)
De tudo o que foi dito desde o momento do acidente em Congonhas, em todas as estações de TV, em todas as emissoras de rádio e em todos os sites, nada teve tanto peso quanto uma palavra de apenas três letras, gritada no Jornal da Globo de terça-feira por uma mãe que embarcou os dois filhos no avião mas ficou em terra: "Não!".
É uma dúvida boba - que agita as florestas interiores deste blogueiro amador desde a mais tenra infância: por que será que um ser humano dotado de voz, como é o caso de noventa e oito por cento dos mímicos, fica fazendo gestos ridículos e macaquices na frente de seus semelhantes, para que eles adivinhem o que é que quer dizer ?
Como é que eles têm a coragem de cobrar ingresso para que a platéia testemunhe estas patetices insuportavelmente chatas ?
Há quase meio século procuro uma resposta razoável para esta dúvida.
Como se dizia no século XVIII, "debalde".
Desde este dia, passei a dividir a humanidade em duas grandes porções. De um lado, os idiotas que praticam mímica.
De outro, os viventes que lançam aos céus uma pergunta a Nossa Senhora do Perpétuo Espanto: "Por quê ? Por quê ?".
O presidente do Senado ameaça fazer novo discurso chamando a amante de gestante.
Joaquim Roriz pensa em se candidatar de novo. Dudu Nobre planeja lançar novo disco. Ladravazes vão chorar nas tribunas e nos telejornais. Marisa Monte pretende dar entrevista. Roberto Carlos vai cantar "Emoções". Atrizes de cara esticada vão continuar assustando crianças na TV. Equipes de ginástica olímpica vão enfiar a cabeça no fundo da piscina, deixar as pernas do lado de fora e ficar mexendo os pezinhos para ganhar medalha. Peruas lastimáveis, com um neurônio e meio na cabeça, vão lotar as clínicas de cirurgia plástica para entupir os peitos de silicone. Músicos de bandana vão aparecer no fundo do palco. Lucélia Santos voltará às telas. Ecologistas vão testar o limite da paciência alheia dizendo que garrafas plásticas destruirão o planeta. Publicitários vão outorgar a si próprios o título de gênios porque fizeram os anúncios de cerveja mais estúpidos do Ocidente.
O Apocalipse se aproxima.
A culpa ?
Estava tudo escrito nas estrelas: é de Cauê.
Europa quer vetar carne brasileira.
Adivinhem de quem é a culpa ?
A Grã-Bretanha expulsa quatro diplomatas russos.
A culpa é de Cauê. Só pode ser.
Terremoto atinge usina atômica no Japão.
A culpa é de quem ? Só pode ser : é de Cauê.
O presidente ficou triste com as vaias. Ficaria menos, se um assessor caridoso passasse para ele esta receita de Pedro Nava, médico e memorialista:
..."QUANDO CAIO NO FUNDO DA FOSSA, QUANDO ENTRO NO DESERTO E SOU DESPEDAÇADO PELAS BESTAS DA DESOLAÇÃO, QUANDO FICO TRISTE, TRISTE (..."MAS TRISTE DE NÃO TER JEITO..."), SÓ QUERO REENCONTRAR O MENINO QUE JÁ FUI"
("Baú de Ossos")
O Brasil só será uma democracia plena no dia em que todo e qualquer cidadão tiver o direito de dar voz de prisão ao primeiro mímico (ou mímica) que encontrar pela frente.
O que faz do Brasil um país divertido é que aqui acontecem coisas que nem Freud, Jung e Lacan explicam.
Uma crise sem precedentes abala os bastidores do recém-nascido Sopa de Tamanco. O correspondente em Brasília, Roberto Borges, entrou em estado de greve, sem maiores explicações.
O sopeiro Toni Marques revogou a indicação da atriz Hermila Guedes como musa plenipotenciária do blog, feita pelo abaixo assinado. Preferiu indicar a âncora da versão inglesa da TV Al-Jazeera, um monumento chamado Ghida Fakhry (abaixo) , jornalista que humilha todas as outras.
A greve ameaçou se espalhar.O Sopa de Tamanco iria interromper suas atividades neste sábado, ao meio-dia, hora de Bagdá, em consequência de diferenças inconciliáveis na redação.
Mas o lastimável espírito conciliador brasileiro terminou prevalecendo.
Ficou decidido : a) dentro do território nacional, na faixa de terra que se estende do Amazonas ao Rio Grande do Sul, a musa é Hermila Guedes - que reinará também sobre as 200 milhas marítimas.
b) fora deste território, o cetro passa para as mãos de Ghida Fakhry.
As partes interessadas assinam e datam a presente declaração.
Fica eleita a Comarca de Bagdá para resolução de eventuais pendências.
Alguém já ouviu uma declaração de Victoria Beckham, a ex-Spice Girl que hoje faz par com o jogador de futebol David Beckham ?
Acaba de se mudar para Los Angeles.
Victoria Beckham é daquele tipo de celebridade que precisa passar quarenta minutos pensando antes de responder, por exemplo, qual é a diferença entre um elefante a uma catedral - ou entre uma anta e um foguete.
É tratada como celebridades AA.
Como diria Jim Morrison, "this is the end" : o fim da civilização ocidental, tal como existiu até hoje.
(http://www.thesun.co.uk/article/0,,2007320635,00.html)
Publicitários adoram propagar a suposta excelência de anúncios produzidos no Brasil.
A platéia dorme, imperturbável.
Fiz as contas: a propaganda brasileira deve estar passando por uma gravíssima crise.
Basta ver os anúncios milionários de cerveja na TV.
Que humor sem graça é aquele, oh Nossa Senhora do Perpétuo Socorro ?
Que tentativas patéticas são aquelas de criar bordões que nenhum débil mental seria capaz de repetir ?
Quanto os "gênios" criadores cobraram para parir estas obras-primas ?
A nós, consumidores desavisados desses anúncios, que aparecem sem aviso prévio na TV, resta acender uma vela para Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, nossa padroeira.
Um dia ela ouvirá nosso pranto.
Pode existir algo mais patético que exibição de capoeirista, no meio da rua, em cidade do exterior, para distrair turista ? Pode existir algo mais risível do que dança de salão ?
A platéia responde em coro: "Não!".
Pois bem: exibições de capoeira e dança de salão foram incluídas no roteiro de um certo "Dia do Turista", promovido pela Secretaria de Turismo em Paris para provar que a cidade não é tão mal-humorada quanto sempre pareceu.
(é só clicar no ícone http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/07/070709_paristuristafp.shtml)
O gênio que armou esta programação merece medalha de ouro.
Castigar os visitantes com exibição de dança de salão e capoeira é a maneira mais rápida de espalhar por todo o planeta o famoso mau humor do parisiense.
Como diria a minha avó diante de alguma esquisitice, "vôtis !"
http://www.geneton.com.br/archives/000242.html
http://www.geneton.com.br/archives/000242.html
O cansaço deixou marcas inconfundíveis no rosto de Gabriel García Márquez: os olhos estão vermelhos, os cabelos desgrenhados clamam por um pente, a camisa branca exibe marcas de suor nas axilas. São 11 e 45 da noite.
Se pudesse escolher, ele estaria dormindo o quarto sono agora. Mas o Prêmio Nobel é homem de palavra. Cumpre a promessa feita horas antes : depois de passar a tarde inteira falando a estudantes de cinema sobre os segredos da criação literária - como se os talentos da imaginação pudessem ser transmitidos numa sala de aula - ele chega sozinho à recepção deste hotel de terceira categoria em Havana. Desaba o peso do corpo sobre uma poltrona vagabunda. Acende um charuto. Aceita com um meneio de cabeça a oferta do garçom : um copo de água mineral.
GGM acha que qualquer tempo concedido a repórteres é puro desperdício. Mas aceitara dar uma entrevista desde que o assunto não fosse literatura. Por imposição do entrevistado, o único tema permitido em nossa conversa seria o mais improvável e aparentemente mais desimportante de todos os assuntos por ventura merecedores de menção num diálogo com um prêmio Nobel de Literatura : o fascínio que as matinês de cinema exercem sobre ele até hoje.
Como todo grande escritor conquista o direito de exercitar pequenas excentricidades sem precisar dar explicações aos intrusos, GGM também determinou com antecedência o número de perguntas: somente seis. Nada além. Número cabalístico ? Jamais se saberá. Não pude perguntar. Não era este o assunto da entrevista.
Eis as descobertas de Gabriel García Márquez sobre as matinês:
1.Por que o senhor considera as matinês tão fascinantes ?
"À hora da matinê - uma palavra francesa metida a empurrões no castelhano - ,no interior dos cinemas, respira-se uma atmosfera lúgubre. Parece que os passos ressoam menos no piso atapetado, mas a verdade é que os que assistem à sessão das três procuram, inconscientemente, passar despercebidos. "É o sentimento de culpa da matinê", já disse alguém, definindo dessa maneira a atmosfera de mistério e clandestinidade que têm os cinemas às três da tarde"
2.O que é que diferencia, então, o frequentador de matinês dos das outras sessões ?
"Um cinema à hora da matinê se parece a um museu. Ambos têm um ar gelado, uma quietude funerária. E, entretanto, é a hora preferida dos verdadeiros cinéfilos. O verdadeiro cinéfilo vai ao cinema sempre sozinho. Senta-se invariavelmente nas laterais da sala. Não mastiga chiclete nem come qualquer tipo de guloseima. Não lê jornais nem revistas, pois permanece nas nuvens, concentrando a tela com ar de concentrada estupidez até começar a projeção"
3.Pelo que o senhor conseguiu observar no escuro, como é que este cinéfilo se comporta depois de iniciado o filme ?
"Desaperta o cinto, desamarra os cordões dos sapatos e o nó da gravata e trata de apoiar os joelhos ou pôr os pés no espaldar da poltrona dianteira. Cinco minutos depois de começada a a projeção, pode estourar uma bomba no cinema que o verdadeiro cinéfilo não se dará conta"
4.Mas não é possível que as matinês sejam povoadas somente por cinéfilos fanáticos. Quem é,então, que faz companhia a eles ?
"Vai também à matinê aquele a quem o cinema não tem a menor importância. É muito provável que a clientela das matinês diminuiria sensivelmente se os colégios secundários fossem fechados. Os estudantes que comumente vão ao cinema em grupos não têm outro interesse além de se refugiar em lugar seguro enquanto as aulas passam".
5.O fato de estudantes se refugiarem nas matinês para escapar das aulas explica o ar de estranha clandestinidade dessas sessões de cinema ?
"Como todos nós o fizemos alguma vez, é também muito provável que essa seja a origem do "sentimento de culpa" e da sensação de clandestinidade de que nós, adultos, padecemos na matinê. Devido a esse pequeno público, um cinema às três da tarde é o lugar mais seguro para um encontro escondido, para os amores secretos - por qualquer motivo - e para fugir a uma obrigação inadiável".
6.Qual foi a melhor definição que o senhor já ouviu sobre as matinês ?
" ``Quando tiver um problema sem solução, vá à matinê´´, dizia, há algum tempo, o gerente de uma importante empresa ao chefe de relações públicas : na quarta-feira da semana seguinte, eles se encontraram à saída de uma matinê".
Meia noite e meia. Gabriel García Márquez disfarça o bocejo, mas, dois minutos depois, emite um suspiro de cansaço e impaciência, como a dizer que chega, basta, já tinha dito o que queria sobre o mistério das matinês, um assunto mais importante do que todas as inúteis teorias literárias. Despede-se com um aperto de mão pouco convincente. Desaparece no penumbra de um corredor de hotel mal iluminado nesta noite de julho em Havana.
***************************
(*) PS: Tanto os encontros com Gabriel García Márquez em Havana quanto as perguntas da entrevista são imaginários: um exercício de realismo mágico amador. Mas as divagações de GGM sobre as matinês são verdadeiras : foram extraídas do texto "Por que você vai à matinê ?", publicado no livro "Textos Andinos" (Editora Record)
O controle remoto me levou a um pouso inesperado num canal a cabo : desembarquei de madrugada numa cena de um filme de Glauber Rocha, "A Idade da Terra", o último que ele fez.
Glauber Rocha faz, em off, sobre imagens de Brasília, um discurso grandiloquente: fala de Terceiro Mundo, capitalismo, socialismo, revolução soviética confrontando a riqueza americana, a roda da História, invasões, Europa conquistando o Novo Mundo, catequeses, cristianismo, utopias, barbáries, caudilhos, a América Latina pagando o preço da progresso alheio, o sonho de que aquela paisagem do Planalto Central produzisse iluminações planetárias.
Eu me lembrei de uma entrevista que fiz uma vez com Antônio Callado, o escritor da obra-prima "Quarup": lá pelas tantas, ele dizia que foi para uma entrevista coletiva do recém-eleito presidente Juscelino. Incrédulo, Antônio Callado viu Juscelino apontar, num mapa, para o local onde um dia se construiria Brasília. Como um louco, o presidente prometeu "Daqui, sairão ondas de civilização. Ondas ! Ondas !".
O escritor-repórter disse que soltou um suspiro de descrença naquele delírio. Mas JK fez Brasília.
O discurso de Glauber Rocha acendeu um devaneio tropical na madrugada: quem sabe, o que falta ao Brasil, hoje, é um toque épico, uma fagulha daquele delírio que Glauber Rocha articulava sobre imagens de Brasília.
Como diria o co-tamanqueiro Amin Stepple, o Brasil não pode se contentar em ser ator de um papelão histórico.
Tive a chance de assistir a uma exibição especial de "A Idade da Terra", numa manhã de sábado, num cineminha em Paris, ao lado de Glauber Rocha. O ano: 1981, meses antes da morte do homem. A sessão fora organizada porque Glauber queria mostrar o filme a um punhado de críticos franceses. Terminada a sessão, Glauber se vira para mim e para o também estudante de cinema Marcos Mendes, hoje professor de cinema em Brasília. Junta os dedos indicadores das duas mãos para perguntar: "Como é ? Fizeram as ligações? Fizeram as ligações ? ".
Quer saber se a gente tinha embarcado naquela torrente desvairada de sons e imagens.
O Brasil - muitíssimo provavelmente - precisa de delírios de grandeza. Ambição de originalidade. Explosões glauberianas. Torrentes e vulcões contra a pequenez. "Ondas de civilização".
Termina aqui o devaneio.
Hora de mudar de canal.
O controle remoto me levou a um pouso inesperado num canal a cabo : desembarquei de madrugada numa cena de um filme de Glauber Rocha, "A Idade da Terra", o último que ele fez.
Glauber Rocha faz, em off, sobre imagens de Brasília, um discurso grandiloquente: fala de Terceiro Mundo, capitalismo, socialismo, revolução soviética confrontando a riqueza americana, a roda da História, invasões, Europa conquistando o Novo Mundo, catequeses, cristianismo, utopias, barbáries, caudilhos, a América Latina pagando o preço da progresso alheio, o sonho de que aquela paisagem do Planalto Central produzisse iluminações planetárias.
Eu me lembrei de uma entrevista que fiz uma vez com Antônio Callado, o escritor da obra-prima "Quarup": lá pelas tantas, ele dizia que foi para uma entrevista coletiva do recém-eleito presidente Juscelino. Incrédulo, Antônio Callado viu Juscelino apontar, num mapa, para o local onde um dia se construiria Brasília. Como um louco, o presidente prometeu "Daqui, sairão ondas de civilização. Ondas ! Ondas !".
O escritor-repórter disse que soltou um suspiro de descrença naquele delírio. Mas JK fez Brasília.
O discurso de Glauber Rocha acendeu um devaneio tropical na madrugada: quem sabe, o que falta ao Brasil, hoje, é um toque épico, uma fagulha daquele delírio que Glauber Rocha articulava sobre imagens de Brasília.
Como diria o co-tamanqueiro Amin Stepple, o Brasil não pode se contentar em ser ator de um papelão histórico.
Tive a chance de assistir a uma exibição especial de "A Idade da Terra", numa manhã de sábado, num cineminha em Paris, ao lado de Glauber Rocha. O ano: 1981, meses antes da morte do homem. A sessão fora organizada porque Glauber queria mostrar o filme a um punhado de críticos franceses. Terminada a sessão, Glauber se vira para mim e para o também estudante de cinema Marcos Mendes, hoje professor de cinema em Brasília. Junta os dedos indicadores das duas mãos para perguntar: "Como é ? Fizeram as ligações? Fizeram as ligações ? ".
Quer saber se a gente tinha embarcado naquela torrente desvairada de sons e imagens.
O Brasil - muitíssimo provavelmente - precisa de delírios de grandeza. Ambição de originalidade. Explosões glauberianas. Torrentes e vulcões contra a pequenez. "Ondas de civilização".
Termina aqui o devaneio.
Hora de mudar de canal.
Se você por acaso cruzar na rua com Cauê, o mascote do Pan, fixe bem os seus olhos nos olhos da criatura, encha os pulmões de ar e pronuncie, com voz clara,nítida e decidida:
"Klatu Barada Nikto!!!".
De novo:
"Klatu Barada Nikto!!!".
( É a senha que deve ser pronunciada diante do robô invasor do filme "O Dia em Que a Terra Parou", para evitar que o planeta seja destruído).
Cauê não vai entender nada.
Mas pelo menos tomará um belo susto.
Uma testemunha jura que viu no céu, ontem à noite, uma entidade cabeçuda e amarelada voando em alta velocidade em direção à zona norte do Rio de Janeiro.
"O vulto riscava o céu numa rapidez incrível", disse a testemunha. "Parecia até um senador fugindo da polícia".
É pule de dez: só pode ser Cauê.
Um prefeito que viajou até Brasília para participar de um jantar de "desagravo" ao falecido presidente do Senado, Renan Calheiros, soltou esta pérola, merecidamente entronizada no título de uma notícia do Globo desta sexta-feira : "Alagoano é, sobretudo, macho".
Um tremor de terra foi sentido nos arredores do cemitério de Cachoeiro de Itapemirim: era Jece Valadão dando três voltas no túmulo.
Quer dizer, então, que ser macho é receber dinheiro de empreiteira ? Ser macho é inventar venda de boi para justificar maracutaias ? Ser macho é transformar o Senado numa piada nacional ?
O que é que Maguila tem a dizer sobre essas coisas ?
Já avisei. Mas aperto a campainha de novo, para acordar os desavisados: o livro do ano, por enquanto, é um relançamento. Título do bicho: "O Afeto Que se Encerra", nova edição da quase autobiografia escrita por Paulo Francis em 1980.
Correi às livrarias, físicas ou virtuais, oh incréu! É tarefa urgente!
A maior contribuição de Paulo Francis ao jornalismo brasileiro não foram as tiradas politicamente incorretas, as pirraças, os ataques, os chiliques.
Era tudo ótimo.
Mas o "maior legado" de PF, como se diz na tribuna das câmaras de vereadores, foi ter dado uma grande contribuição para que se consolide no Brasil a tradição de uma "prosa clara e instruída".
Não é pouco, num país em que sempre houve confusão entre escrever bem e escrever difícil. Basta passar os olhos sobre os textos produzidos por nossos advogados: se esta república fosse realmente uma democracia, eles deveriam receber voz de prisão por agressões repetidas à comunicabilidade. Idem para noventa por cento dos autores de teses acadêmicas. Idem para críticos literários ilegíveis. Ia faltar espaço no Carandiru, se o presídio ainda existisse ( em tempo: a expressão "prosa clara e instruída" é da lavra de Francis).
A construção de uma "prosa clara e instruída" num país infestado de bacharelices é um trabalho lento, uma tarefa coletiva, um edifício que se ergue tilojo por tijolo, geração após geração.
Jovem jornalista, aliste-se no Exército dos Defensores do Texto Claro e Instruído.
Vista a farda. Estufe o peito. Bata continência para o general Francis ( e um punhado de outros).
A influência do texto de Francis sobre as novas gerações é cem por cento benéfica, portanto.
O que ele dizia sobre nossos jornais um dia pode deixar de ser verdade,
se os cultores da "prosa clara e instruída" se multiplicarem a cada geração:
"Nossa imprensa: empolada, previsível, chata. Como é chata, meu Deus".
Tomara que eu tenha citado certo.
Fiz minha boa ação do dia: recomendar "O Afeto Que se Encerra"; buzinar em favor da "prosa clara e instruída".
Já posso voltar a relinchar e a comer farelo.
( aqui, um texto de Ivan Lessa sobre os dez anos sem PF:
http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/02/070205_ivanlessa_tp.shtml)
Não perca tempo por aí. É tudo ilusão passageira - que a brisa primeira levou.
Dê uma olhada: somente no Sopa de Tamanco você encontra o melhor da Internet; as dicas mais certeiras; as tamancadas mais velozes. Nossas antenas estão ligadas no planeta. Nossos olhos e ouvidos trabalham por você dia e noite.
Nossos blogueiros são os gatilhos mais rápidos do Oeste.
Aceitamos doações de tíquetes-refeição.
Uma autoridade responsável pelo policiamento dos jogos Pan-Americanos disse agora, na CBN, que os motoristas devem dar prioridade ao deslocamento da "família PAN" pelas ruas da cidade.
"Família Pan" (!!!!!!!)
O homem usou várias vezes a expressão.
O CVV duplicou o número de atendentes de plantão.
Os jornais de hoje informam que Erasmo Carlos, o compositor, declarou o seguinte, durante a gravação de um programa de TV: quando tiver uma neta, vai batizá-la de Milta, em homenagem a Milton Nascimento.
Milta!
Vistos em perspectiva, até que os ataques do 11 de Setembro, o tsunami, as bombas de Hiroshima e Nagasaki, a proibição do livro sobre Roberto Carlos e as entrevistas de Marisa Monte não são acontecimentos tão graves.
Ernesto Geisel e Albert Einstein tinham razão quando ensinaram ao mundo que tudo, tudo é relativo.
Tive um pesadelo: Cauê, o mascote do Pan, ensaiava uma coreografia diante da torcida organizada.
Todo mundo, com as mãozinhas para cima, cantava "eu-sou-brasileiro-com-muito-orgulho-com-muito amô-ô-ô-ô"
Neste momento, o lúcifer aparecia em pessoa, com um cetro tridentado, os olhos vermelhos expelindo uma fumaça que cheirava a enxofre.
Houve um início de tumulto.
O chefe do policiamento pedia calma à "família PAN".
Uma voz, parecida com a de Sílvio Santos, dizia "ôima! ôima! ôima!" pelo sistema de alto-falantes.
Ninguém entendeu nada.
Acordei sem ver o final da história.
Pode parecer besteira, mas deve ser sintoma de algum fenômeno estranho: por que será que médicos e enfermeiras sempre usam obsessivamente diminutivos quando falam com os pacientes ?
Deve ser o desejo inconsciente de reduzir os pacientes à condição de crianças indefesas. Só pode ser. Um psicanalista de botequim explicaria a preferência pelos diminutivos.
Faça o teste. Vá a uma consulta. Ou a um laboratório. Com certeza, você ouvirá algo assim: "Agora, estenda o bracinho que vou dar uma picadinha para tirar sangue.Não vai doer nadinha".
Ou: "Vou dar uma apalpadinha. Vai incomodar só um pouquinho".
E assim por diante.
O Brasil só será uma democracia plena no dia em que todo paciente tiver o direito de dar voz de prisão a médicos e enfermeiras que só falam no diminutivo.
Dois ingleses trocaram o rio Tâmisa pelo rio Xingu. Vão passar os próximos meses às voltas com mosquitos, jaguatiricas, cascavéis, tamanduás e ariranhas.
Ah,sim: nem tudo é bicharada. De vez em quando, aparece um índio dizendo "uga-uga" e perguntando por onde anda Sting.
(aqui, notícias da expedição:
http://www.bbc.co.uk/portuguese/forum/story/2007/07/070705_projetoxingu13.shtml
Você deve estar pensando: que esquisitice, trocar os confortos tâmisos pelos desconfortos xinguaras.
Não é não.
Trocas absurdas são uma vocação britânica.
O Príncipe Charles não trocou Diana por Camila ?
"Faz algum tempo meu médico sugeriu que eu adotasse hábitos mais saudáveis do que beber vinho e fornicar. Ele me perguntou se eu tinha alguma idéia. Respondi que sim: "Homicídio". Ele riu, nós dois rimos, só que eu não estava rindo. Pobre coitado, mal sabe que fim doloroso e perfeito eu planejara para ele quando, depois de oito dias de cama com algo semelhante à cólera, o sujeito ainda assim se recusou a me atender em casa"
"Gosto de carros velozes, bem feitos, gosto de motéis isolados com máquinas de gelo e anonimato apavorante; e por vezes pego no volante e,sem aviso nem destino definido, dirijo sozinho até mil e quinhentos quilômetros. Só uma vez consultei um psiquiatra; em vez disso, eu deveria ter saído para dar uma volta de capota abaixada, quando o vento soprasse e o sol brilhasse"
"Considero absurda e obscena esta indústria baseada no apego à juventude, medo de envelhecer, terror da morte. Quer quer viver para sempre, afinal? A maioria de nós, pelo jeito; mas é idiotice. Afinal, existe uma coisa chamada saturação da vida: o ponto em que tudo é puro esforço e repetição total".
"Uma obra de arte é o grande mistério, a mágica suprema; o resto é aritmética ou biologia. Creio que conheço bem o ato de escrever; mesmo assim, quando leio um texto bom, uma obra de arte, meus sentidos navegam por um universo de deslumbramento: como ele conseguiu fazer isso ?
Como é possível ? ".
O texto é de Truman Capote, o "Auto-retrato" que ele escreveu em 1972. Aparece na antologia "Os Cães Ladram", publicada no Brasil na coleção de bolso da
L & PM Editores.
Vale a pena.
O Sopa de Tamanco acaba de cometer uma boa ação: dar de presente, para quem não as conhecia, estas pérolas de Truman Capote.
Mas o locutor-que-vos-fala fica por aqui. Como diriam os porta-vozes, "lamento informar", mas não posso passar a manhã inteira datilografando Truman Capote para vocês, internautas que, com noventa por cento de certeza, estão a essa hora usando indevidamente o computador do trabalho para navegar pelo Sopa de Tamanco longe dos olhares da chefia.
Lá vem ele, o chefe. Disfarce. Abra a página do New York Times. Ou da The Economist. Faça ar de compenetrado (a).
Pronto. O bicho passou batido. Deve ter ido tomar um café.
Tudo não passou de um susto: já podeis da pátria filhos ver contente a mãe gentil.
O Sopa de Tamanco vos espera de braços abertos.
Depois de recorrer ao fracassado expediente de escrever sobre ópera apenas para parecer culto e profundo e,assim, enganar moçoilas incautas, o sr. Nicomar Lael não suportou o peso da admoestação pública a que foi submetido aqui, nesta Sopa.
Botou o rabo entre as pernas e sumiu do mapa, silente como uma hematita.
Fez bem.
Deve estar se preparando para ir ver o show do Police, porque sabe que é o único lugar do planeta em que não correrá o risco de se encontrar com o abaixo assinado.
O Maracanã será cenário da grande procissão dos idiotas - tanto no palco quanto na platéia.
É bom que o sr. Nicomar escolha ir ao estádio, como medida extrema de proteção.
Se circular pelas ruas, correrá riscos.
Porque, caso ocorra um encontro entre o abaixo assinado e o malfadado impostor, já não haverá ofensas verbais a trocar : o sr. Nicomar correrá o risco de sentir na pele a tradução literal da expressão SEIKEN JODAN ZUKI.
Para quem não sabe: um golpe certeiro de karatê.
(maiores informações aqui: http://www.kyokushinkaikan.com.br/v2007/br/kihongeiko.htm)
Aqui:
http://www.geneton.com.br/archives/000238.html
Uma das mais repetidas ( e justificadas ) críticas que se fazem aos blogs é que eles, com frequência, tornaram-se palco para desfile de confissões inúteis sobre a vida pessoal de blogueiros. A vida pessoal de cada um ( com exceção da de Hermila Guedes, musa informal deste blog ) não deve interessar a ninguém ( por falar em HG: o que será que ela tem feito? Qual é o batom que ela usa? Quanto tirou na prova de matemática no ginásio? )
Mas, para não quebrar uma tradição entre os blogueiros, abro uma exceção: vou descrever cinco minutos da vida pessoal do abaixo assinado.
Querido diário: acordei. Relinchei três vezes. Vomitei sobre uma página de jornal que falava das maracutaias do Senado. Relinchei de novo. Comi um pouco de farelo. Confirmei por telefone a hora de minha consulta no veterinário. Acessei o Sopa de Tamanco.
É simples assim.
Como diria Jack Palance naquele programa da TV Manchete, acredite......
(faz pausa; olha para a câmera dois)....se quiser!
Cientificamente comprovado: a taxa de vaidade de jornalistas é, em média, noventa vezes superior à taxa de talento.
Há anos venho dizendo que não se deve levar esta raça cem por cento a sério.
Depois não diga que não avisei.
Já avisei. Mas aperto a campainha de novo, para acordar os desavisados: o livro do ano, por enquanto, é um relançamento. Título do bicho: "O Afeto Que se Encerra", nova edição da quase autobiografia escrita por Paulo Francis em 1980.
Correi às livrarias, físicas ou virtuais, oh incréu! É tarefa urgente!
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A maior contribuição de Paulo Francis ao jornalismo brasileiro não foram as tiradas politicamente incorretas, as pirraças, os ataques, os chiliques.
Era tudo ótimo.
Mas o "maior legado" de PF, como se diz na tribuna das câmaras de vereadores, foi ter dado uma grande contribuição para que se consolide no Brasil a tradição de uma "prosa clara e instruída".
Não é pouco, num país em que sempre houve confusão entre escrever bem e escrever difícil. Basta passar os olhos sobre os textos produzidos por nossos advogados: se esta república fosse realmente uma democracia, eles deveriam receber voz de prisão por agressões repetidas à comunicabilidade. Idem para noventa por cento dos autores de teses acadêmicas. Idem para críticos literários ilegíveis. Ia faltar espaço no Carandiru, se o presídio ainda existisse ( em tempo: a expressão "prosa clara e instruída" é da lavra de Francis).
A construção de uma "prosa clara e instruída" num país infestado de bacharelices é um trabalho lento, uma tarefa coletiva, um edifício que se ergue tilojo por tijolo, geração após geração.
Jovem jornalista, aliste-se no Exército dos Defensores do Texto Claro e Instruído.
Vista a farda. Estufe o peito. Bata continência para o general Francis ( e um punhado de outros).
A influência do texto de Francis sobre as novas gerações é cem por cento benéfica, portanto.
O que ele dizia sobre nossos jornais um dia pode deixar de ser verdade,
se os cultores da "prosa clara e instruída" se multiplicarem a cada geração:
"Nossa imprensa: empolada, previsível, chata. Como é chata, meu Deus".
Tomara que eu tenha citado certo.
Fiz minha boa ação do dia: recomendar "O Afeto Que se Encerra"; buzinar em favor da "prosa clara e instruída".
Já posso voltar a relinchar e a comer farelo.
(outros textos no blog SOPA DE TAMANCO:
http://sopadetamanco.blogspot.com/)
Informa a BBC: um nadador inglês chamado Lewis Gordon Pugh vai mergulhar em águas geladíssimas do Pólo Norte, no próximo domingo, porque quer chamar a atenção dos terráqueos para o aquecimento global.
Para que tanto sacrifício, Little Pugh ?
Bastaria nos mandar um e-mail coletivo com os dizeres "Aquecimento Global. Importante!".
O resultado seria o mesmo:
a gente não iria ler de jeito nenhum.
E você escaparia de um resfriado.
Ainda dá tempo. Faltam três dias. Os praticantes de nado sincronizado continuam soltos ?
E o que dizer daqueles filmes que fazem o espectador dormir profundamente ? São as imagens que terminam soterradas naquele misterioso território onde a Arte se encontra com o Sono.
Aqui, um desfile de títulos:
http://www.ricardocalil.com.br/
Joel Silveira conta essa. Uma vez, recebeu uma sondagem de um assessor direto do presidente Jânio Quadros. O assessor informou que ele, Joel, ia ser nomeado para o conselho consultivo da Companhia Brasileira de Álcalis.
Resposta de Joel à oferta :
- Aceito o convite ! Só quero tirar duas dúvidas. Primeira : quanto vou ganhar ? Segunda : o que é álcalis, pelo amor de Deus ? ”.
Terminou nomeado.
Quando alguém começar a falar em Pan ou em Cauê, o mascote dos jogos, diga a frase mágica: "Klatoo Barada Nikto !"
O interlocutor certamente exibirá um ar de espanto.
Você repetirá:
"Klatoo Barada Nikto !".
Depois de fitar você por cinco segundos e meio, ele sumirá na multidão.
Você caminhará na direção contrária. Aos seus botões, você dirá, em voz baixa e agradecida:
"Klatoo Barada Nikto ! Klatoo Barada Nikto !"
(*) Para quem chegou atrasado: Klatoo Barada Nikto é a senha que, dita diante de um robô, evita a destruição do planeta no filme "O Dia em Que a Terra Parou". É cientificamente comprovado: toda vez que um humanóide estiver sob o risco de sofrer um abalo ( algo que acontece, por exemplo, quando um interlocutor começa a falar em Pan) basta que a potencial vítima pronuncie a senha mágica. A ameaça se evaporará.
Ah, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto.... A comédia de erros de péssima categoria encenada pelo Senado só consegue, a essa altura, provocar,na platéia, suspiros de imenso tédio, imensa indignação, imensa vergonha. Chega. Basta.
Mas recordar é viver:
o presidente de uma Casa que um dia foi respeitada recebe dinheiro de uma empreiteira para cobrir despesas pessoais. Personalíssimas.
Em qualquer paiseco do quarto do mundo, a simples suspeita seria suficiente para fazer o presidente da ex-Casa de Respeito se licenciar.
Mas não.
Aqui, nesta republiqueta de décima-oitava categoria, o presidente do Senado finca o pé, dá soco na mesa, diz que os que querem afastá-lo "vão sujar as mãos".
É uma inversão total de papéis.
Que palhaçada. Que vergonha. Que lixo.
Nem em bordel se encena espetáculo de tão baixa categoria.
Inventaram de chamar Xuxa, a velhota saltitante, para cantar contra o aquecimento global naquele show na praia, sábado passado.
A vingança dos céus veio logo.
Hoje, segunda, dia de inverno, faz um calor desgraçado no Rio.
Bem-feito !
ERNESTO SABATO: "O Xul Solar fez os horóscopos dos meus dois filhos e durante muitíssimos anos eu resisti em conhecê-los. Sempre tive medo do futuro, porque no futuro, entre outras coisas, está a morte"
JORGE LUIS BORGES: "Eu penso que, assim como a gente não pode se entristecer por não ter visto a Guerra de Tróia, não ver mais este mundo tampouco pode entristecer"
ERNESTO SABATO: (...) "Eu nunca quis vê-los (os horóscopos). Sabe que foram se cumprindo?"
JORGE LUIS BORGES( com assombro) : "E como são ? O que pressagiavam?"
ERNESTO SABATO (com uma voz íntima, quase para dentro) : "Um misterioso cruzamento de fortuna e infelicidade.Isso, Borges, isso".
(Do livro "BORGES/ SABATO:DIÁLOGOS"
O Brasil me lembra uma bomba-relógio feita às pressas e de mecanismo defeituoso. Dessas que nunca explodem.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Gay Talese é ídolo de jornalistas. Co-fundou um estilo de reportagem : o chamado "novo jornalismo". É a arte de misturar técnicas jornalísticas e de ficção num só texto. Nove entre dez referências a Gay Talese dizem que o melhor texto que ele escreveu é a famosa reportagem sobre Frank Sinatra. Os "velhos olhos azuis", como se sabe, tinham horror a jornalista. Sinatra não recebeu o repórter, portanto. Mas o repórter achou que poderia escrever a reportagem sem ouvir o personagem principal. Os dois estavam certos: Sinatra, no horror aos jornalistas ; Talese, na certeza de que poderia produzir a peça.
Questão de gosto: o melhor texto de Gay Talese é o perfil que ele escreveu sobre um redator de obituários. É uma lição a jornalistas entediados que acham que assunto aparentemente desinteressante "não vale matéria". Ora,ora. A descrição da rotina de um obscuro redator de obituários rendeu uma das melhores páginas já produzidas por um jornalista ( a reportagem é encontrável na coletânea "Fama & Anonimato", publicada aqui na Lulalândia). Quem já passou quinze minutos numa redação sabe identificar, pelo cheiro de cloreto de potássio, esta triste figura: o jornalista, pretensamente sabidinho, que se investe de poderes ( dados por quem? ) para decidir o que "rende matéria" e o que "não rende". Ou seja: o que é que o público deve ou não deve ler. O bicho vive com uma injeção imaginária de cloreto de potássio na mão, igual aos carrascos que executam prisioneiros condenados à morte no Texas. A pilha de reportagens mortas no nascedouro por estas figuras daria para encher dez vezes o cemitério Joe Byrd (onde os executados do Texas são enterrados, em covas abertas por outros presos).
Dois repórteres brasileiros acabam de escrever sobre Gay Talese. Um é Jorge Pontual, na (boa!) revista de reportagens "Brasileiros", recém-lançada, já nas bancas e nas melhores casas do ramo. Pontual entrevistou Talese, em Nova York. Disse a ele que gostaria de saber o que é "ser Gay Talese". O "ídolo dos jornalistas" fez uma proposta ao repórter: "Aposto que sua história é mais interessante do que a minha.Uma boa história precisa de uma cena. Quer cena melhor do que esta? Você me encontra porque quer aprender a ser como eu e descobre que a verdadeira história é você mesmo. Sensacional! Escreva isso. A verdade é mais forte que a imaginação" ( o resto da história, na revista, por R$ 7,90). Ah : Talese é fã de Simone, a cantora.
O outro repórter que escreveu sobre o ídolo dos jornalistas é Paulo Polzonoff, num livro que acaba de sair do forno :"A Face Oculta de Nova York"(Editora Globo). Polzonoff anota, numa livraria em Nova York, a presença de uns cinquenta gatos pingados no lançamento de um livro autobiográfico de Talese: "Não era algo fácil de admitir, mas eu fazia parte de um clubinho muito do estranho. Vários dos meus amigos jamais ouviram falar em Gay Talese. Minha mãe não tem a menor idéia de quem seja ele. E, convenhamos, é bem possível que você, leitor, tampouco imagine quem ele seja. De repente, senti-me cokmo um menino tolinho que tem adoração pelo maior colecionador de selos do mundo - quem quer que seja".
O último a ler "Brasileiros" e "A Face Oculta de Nova York" é mulher do padre.
“LULA METALÚRGICO” FAZ UMA CONFISSÃO: “NÃO TENHO VOCAÇÃO POLÍTICA”
O sobrenome não era um sobrenome. Era uma profissão: metalúrgico. O nome não era um nome. Era um apelido: Lula. A combinação esquisita de um nome que era apelido e um sobrenome que era uma profissão servia para identificar aquele sindicalista que despontava para a fama: Lula Metalúrgico. Era assim que nós, repórteres que cobríamos a visita do sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva ao Recife, no remoto ano de 1979, o chamávamos.
Lula já tinha sido capa de uma revista semanal. Começava a atrair a atenção do Brasil como o primeiro líder sindical surgido sob o regime militar. Fazia, ali, a primeira visita a Pernambuco depois de ficar conhecido. Ainda não era uma celebridade.
Quem poderia imaginar que aquele pernambucano que voltava ao Recife para defender um “novo sindicalismo” iria, um dia, subir a rampa do Palácio do Planalto como presidente? Ninguém. O Partido dos Trabalhadores não existia. Era apenas uma idéia na cabeça daquele sindicalista, que, ao abrir a boca diante de platéias, subtraía o “s” do plural das palavras com a mesma desenvoltura com que soltava imprecações contra governos militares que manipulavam os índices de inflação.
O Lula que desembarcou no Recife era um líder sindical que resistia às cantadas para se engajar em partidos políticos – não importa quais fossem. Descubro em meus arquivos uma gravação em que ele avisa: “Não sou filiado a partido político algum. Não sou filiado à Arena, não sou filiado ao MDB. Fui contra o bipartidarismo quando ele foi instituído. Por uma questão pessoal, enquanto houver bipartidarismo, não vou me filiar a partido político algum. Quem sabe, um dia, surja um partido em que os trabalhadores tenham voz, onde os trabalhadores sejam maioria. Quando surgir esse partido, serei – não tenham dúvida – um dos filiados”.
O sindicalista Lula estava a um milhão de anos-luz do candidato Lula que, quase um quarto de século depois, seria capaz de dar bom-dia a poste em troca de um voto – como faz todo candidato que se preza. O Lula Metalúrgico pichava gente da Arena e do MDB, dispensava a ajuda de estudantes que se ofereciam para distribuir panfletos a operários, acabrunhava-se com a intromissão de intelectuais na atuação do sindicato, fazia restrições à ótica das pastorais operárias da Igreja Católica, esculachava a conduta da chamada “grande imprensa”. Aos que tentavam sondar seus planos futuros, oferecia uma resposta que, hoje, soa como curiosidade arqueológica. Lula dizia que, simplesmente, não tinha vocação política. Dava-se por satisfeito no exercício da presidência do Sindicato dos Metalúrgicos.
O então presidente da seção estadual do MDB – Jarbas Vasconcelos, oposicionista brigão que, duas décadas depois, se elegeria duas vezes governador de Pernambuco – é o cicerone na visita que o sindicalista barbudo faz ao arcebispo de Olinda e Recife, Dom Hélder Câmara. O arcebispo vivia numa casa modestíssima, nos fundos da Igreja das Fronteiras, no bairro das Graças, no Recife. Um pôster de Martin Luther King – com a inscrição “Eu tenho um sonho” – ornamentava a parede da sala. Lula troca gentilezas com Dom Hélder. Diz que a trajetória do arcebispo servia de exemplo para os trabalhadores. Dom Hélder ouve o elogio com um meio-sorriso nos lábios. Lula apresenta aos anfitriões o filho caçula, um menino de um ano e poucos meses: “Ele tem esse nome de costureiro, Sandro, mas é macho!” Dom Hélder, Jarbas Vasconcelos e a mulher de Lula, Marisa, riem.
Aquela viúva que atraíra os olhares do também viúvo Luiz Inácio Lula da Silva se tornaria, tanto tempo depois, a primeira-dama do país. O primeiro marido de Marisa, um motorista de táxi, morreu assassinado num assalto. A primeira mulher de Lula morreu de parto – junto com o primeiro filho do casal.
Depois da visita a Dom Hélder, a estrela emergente do sindicalismo brasileiro faz uma pausa no périplo recifense para conversar com os repórteres. Hoje a cena seria impensável, mas na época era assim que acontecia: em vez de convocar a imprensa para o local da entrevista, Lula é que se dava ao trabalho de ir a uma redação. O “sapo barbudo” (apelido que ganharia dez anos depois, durante a campanha presidencial de 1989) revisita, então, memórias distantes:
Em que situação você saiu de Pernambuco para morar em São Paulo?
Não me lembro se foi em 1951 ou 1952. Mas saí de Pernambuco para não morrer de fome. Fui com toda a família. Meu pai já estava lá. Minha mãe tinha um pedaço de terra em Garanhuns, trabalhava na roça e não conseguia sustentar a família. Então, a única forma que ela encontrou para sobreviver – na época, eu era criança – foi ir embora, para onde estava o marido, para poder tentar cuidar dos filhos. Eu tinha uns seis anos.
Quando você começou a trabalhar em São Paulo?
Comecei a trabalhar em 1958, com 13 anos de idade. Trabalhava como tintureiro, numa tinturaria. Trabalhei quase três anos como tintureiro. Depois, entrei numa empresa metalúrgica. Trabalho hoje nas Indústrias Villares.
Como é que você entrou no sindicato?
Eu entrei no sindicato em 1969. Um dia, fui lá ver uma assembléia, gostei e fiquei.
Você reconhece que é o primeiro líder político que surgiu fora do âmbito parlamentar nesses últimos tempos?
Nem me considero uma liderança. Eu me considero, muito mais, um elemento que conseguiu captar os desejos de uma classe. Tentei levar os desejos dessa classe adiante e transformá-los numa bandeira de luta. Acho que a sociedade inteira tem muita responsabilidade – como os estudantes, com aqueles movimentos de 1977- e os intelectuais. Nós, os trabalhadores, somos um dos setores que entraram na briga.
Você se considera, então, um resultado da abertura comandada pela sociedade civil?
Exatamente. Porque faço parte dessa sociedade.
Além da circunstância política concreta da abertura, o fato de você ter conseguido se tornar porta-bandeira de uma classe pode ser atribuído a quê? Haveria uma vocação pessoal ou foram apenas as circunstâncias políticas que favoreceram?
Já começa a ficar difícil falar a gente... Gostaria que, aí, você colocasse de sua cabeça como é que você vê a coisa. Porque, para mim, fica muito difícil falar...
Alguma experiência passada de partidos políticos no Brasil entusiasmou você?
Não. Lamentavelmente, nenhuma.
Que experiência chegou perto do que você espera de um partido representativo?
Nenhum partido me entusiasmou. O Partido Comunista, por exemplo, sucumbiu da mesma forma que nasceu. Quer dizer: nasceu e morreu. Não foi obra dos trabalhadores. Veio de cima para baixo, um negócio imposto à classe trabalhadora. Alguns partidos que se diziam representantes da classe trabalhadora, como o PTB, o PC e o próprio Partido Socialista, nunca foram legitimamente representantes dos trabalhadores, porque não nasceram da classe trabalhadora. Foram impostos à classe.
Quais são, afinal, os planos de Lula na política?
Não sei. Não pensei ainda. Deixe contar uma coisa: toda essa vida que tenho levado tem me afastado muito de minha mulher e dos meus filhos. Hoje, praticamente, não disponho de um horário para minha família. Não posso permitir que minha mulher fique sozinha na hora de cuidar da família. A única coisa de que tenho certeza é que, no dia 25 de abril de 1981, eu me desligo do sindicato. O que vai acontecer depois daí só vou saber a partir do dia 25. Não tenho vocação política. Por enquanto, o que pretendo é continuar o trabalho no sindicato.
Vinte e três anos depois dessa entrevista, eis Luiz Inácio Lula da Silva aos primeiros minutos de um sábado, véspera da eleição presidencial de 2002. Diante de uma massa compacta de fotógrafos, repórteres e cinegrafistas, ele faz, num púlpito, um pequeno pronunciamento sobre o debate com José Serra, o candidato do PSDB. Depois dos agradecimentos de praxe, volta a exercitar o humor que, há tempos, diante de Dom Hélder, levou-o a brincar com o nome do filho Sandro.
Lula pede uma trégua de “seis horas” aos repórteres e fotógrafos. Diz que, ao final da campanha, já não agüenta encarar microfones e máquinas fotográficas de manhã, à tarde e à noite. “Depois de uma campanha como essa, sou capaz de pegar o barbeador para fazer a barba de manhã e começar a falar, porque vou pensar que o barbeador é microfone. Um candidato pode abrir a geladeira para pegar água: quando a luz da geladeira acender, ele vai fazer uma declaração, porque vai pensar que a luz é de uma câmera...”
De fato: os momentos de solidão de Lula foram raríssimos naquela campanha. Quem observou com atenção o balé dos candidatos durante o debate nos estúdios da Central Globo de Produção flagrou uma imagem rara. Minutos antes de serem chamados ao palco, ambos se concentravam longe dos olhos do público, numa espécie de baia, em extremidades opostas do palco. José Serra trocava confidências com assessores. Num espaço de tempo que deve ter parecido uma eternidade para um homem assediado a cada aparição pública, Lula vivia seus três minutos de solidão. Caminhou de um lado para o outro, no espaço exíguo. Olhava para o chão. Em que estaria pensando?
O líder sindical que em 1979 se incomodava com a falta de tempo para se dedicar à família transformara-se no candidato que, em 2002, clamava por uma trégua no bombardeio dos flashes fotográficos. Eleito presidente, ele teria de aprender a ser observado o tempo todo – pelo resto da vida, como acontece com todos os que um dia subiram a rampa com a faixa no peito.
(TRECHO DO LIVRO "DOSSIÊ BRASÍLIA : OS SEGREDOS DOS PRESIDENTES")
Brasília : esotérica e festeira comunidade onde todo mundo vive a dar medalha a todo mundo.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Como se dizia antigamente, "direto ao assunto": tive a chance de ouvir do "Quinto Beatle", o super-produtor George Martin, qual é o segredo que explica a imbatível performance da dupla de compositores Lennon-McCartney.
George Martin e a dupla
Aos fatos:
1) assim que começou a trabalhar com os Beatles, Martin descobriu que a melhor tática para garantir a qualidade das músicas seria incentivar ao máximo a competição - que já existia - entre Lennon e McCartney. O esquema "maquiavélico" deu certo. Certíssimo. Como George Martin aplicou esta tática? (Já,já, daqui a dois parágrafos, ele dirá).
2) meses antes de morrer, ao receber a visita de Martin em casa, no edifício Dakota, em Nova York, John Lennon fez a Martin uma confissão que resume a obsessão do ex-beatle com a qualidade musical - uma bela virtude num compositor pop.
A gravação completa do depoimento de Martin - colhido na igreja que ele transformou em estúdio, em Hampstead, no norte de Londres, em 1998, para o programa "Milênio"(Globonews) - repousa numa prateleira do Centro de Documentação da Rede Globo, o Cedoc. O repórter sai de cena. Passa a palavra para o Quinto Beatle, num depoimento agora publicado pela primeira vez:
"Os Beatles, no começo, não eram grandes artistas. Eram jovens muito inteligentes que, no entanto, não demonstravam sinal algum de que poderiam compor boa música. Não vi evidência alguma de que seriam bons compositores".
"A primeira vez que soube dos Beatles foi quando Brian Epstein, empresário do grupo, trouxe uma gravação para o meu escritório. Era horrível. Pude entender por que todos tinham dito "não" a eles. O melhor que poderiam me dar era "P.S.I Love You". Não era uma música muito boa. Copiaram o que ouviam dos Estados Unidos, mas também aprenderam o ofício bem depressa".
"A combinação entre John e Paul era bastante interessante, pelo seguinte: tínhamos, ali, dois jovens muito talentosos. Cada um de um jeito, os dois eram músicos e compositores muito bons - que trabalhavam juntos, numa espécie de competição: cada um tentava superar o outro. Um subia nas costas do outro o tempo todo".
"Quando comecei a trabalhar com os Beatles, logo no primeiro ano,depois que eles gravaram "Please, Please Me", eu disse: "Senhores, este é o primeiro sucesso..". Propus um desafio: "Agora, tragam-me algo melhor!". Os dois voltaram com "From Me To You" - que era boa. Depois, me trouxeram "She Loves You", melhor ainda. Em seguida, "I Wanna Hold Your Hand",fantástica! A cada vez, compunham algo diferente da anterior. Não era como "Guerra nas Estrelas I", "Guerra nas Estrelas II", "Guerra nas Estrelas III". Davam um tratamento original".
"Digo que esta curiosidade e este esforço para transpor o horizonte é que caracterizaram o pensamento de John e Paul. Isso é que os fez tão bons! Sempre tentavam melhorar, sempre tentavam ser mais originais. Perguntavam-me: "Que som podemos ter? O que é que você pode nos dar? O que é que não sabemos ainda? Ensine!".
Isso é que os tornou excelentes".
"O meu último encontro com John Lennon foi no Edifício Dakota, em Nova York, onde ele morava. Jantamos, meses antes de ele morrer. Yoko não interferiu. Ficou quieta a noite toda. John e eu ficamos, então, conversando sobre o nosso passado. Não tínhamos planos de trabalhar juntos. Eu tinha meus projetos, John tinha os seus. Eu não tinha intenção de voltar a trabalhar com ele. Mas falamos de nossas gravações. John se virou e me disse: "Quer saber? Se eu pudesse, gravaria de novo tudo o que fizemos!". Eu respondi: "Você não pode estar falando sério! Eu detestaria gravar tudo de novo, porque seria maçante". Mas John me disse que poderíamos fazer tudo ainda melhor. Isso foi extraordinário!"
É assustador. A máquina do mundo em funcionamento:
http://www.poodwaddle.com/worldclock.swf
"O futuro vai chegar", promete sua Excelência.
Nem é preciso tanto. Basta que o passado realmente passe.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Vágner Love, aquele jogador que pinta a juba de azul para que a cor do cabelo combine com a cor da camisa da seleção, continua solto ?
Todo e qualquer animal bípede semi-alfabetizado sabe que é importante tentar salvar a natureza, mas..... antes até de terminar o primeiro parágrafo, já ouço, claro e nítido, o ronco coletivo da platéia.
Pode existir na face da terra assunto mais chato do que defesa da ecologia, reciclagem de materiais, preservação de espécies ameaçadas e coisas parecidas ?
Não por acaso, um sábio criou a palavra mágica: Ecochato.
Hoje, sábado, TVs estão transmitindo shows em defesa das boas causas ecológicas.
Depois não digam que o Sopa de Tamanco não avisou : tirem as crianças da sala, o mais rápido possível. Agora. Sem perda de tempo.
Porque há sempre o risco de Sting irromper no vídeo, a qualquer momento, ao lado daquele índio com beiço de plástico.
(Mas, como nem tudo é perfeito, há coisas piores no planeta: o que dizer de quem desfila na orla, no Rio de Janeiro, todo vestido de branco, porque assim estará combatendo a violência ?)
Um leitor pergunta, curioso: há uma maneira segura de identificar um jornalista ?
Claro.
Faça o teste: passe cinco minutos observando fixamente o suspeito. Se, depois dos dois primeiros minutos, ele não mugir nem latir nem se olhar no espelho, a dúvida estará resolvida.
O suspeito não é jornalista. Pode ser liberado para seguir viagem.
Caso contrário, é recomendável ligar para a carrocinha.
Xuxa - sim: ela, x + u + x + a - cantando na praia contra o aquecimento global.
Ah, Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, rogai por nós.
Recomenda o meu horóscopo: "Vá à rua, agora mesmo, e lute. A vitória é certa".
Chego à janela, olho lá fora, a chuva cai pesada. Decido: a vitória será adiada.
Joel Silveira, datilografado por GMN
É o que sempre digo : bocejo, logo, existo.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Conhecer gente famosa é uma desgraça. Conviver com um ídolo é pior ainda.
Por dois motivos. Primeiro: por medo de falar uma grande tolice diante do guru, a gente se cobre de constrangimento quando conversa com ele. O encontro pode ser o mais banal, o mais trivial possível. Mas a gente termina medindo cada frase. Fiz o cúmulo: cheguei a me refugiar uma vez numa sala lateral de uma redação, para não envenenar à toa a convivência com o guru. Mas ele, esperto, foi até o meu esconderijo: "Você se escondendo!!!". Retribuí a gentileza com um riso amarelo.
Segundo motivo por que conhecer gente famosa é uma desgraça: a gente fica se policiando para não cometer, diante de amigos, estranhos ou desconhecidos, o pecado horroroso do "name-dropping" (a mania de ficar citando nomes célebres no meio de uma frase, para dar a ilusão de importância....).
Os dois motivos me impediram de escrever um texto na primeira pessoa sobre dez anos de contatos pessoais e profissionais, em redações no Rio, em Londres e em Nova York, com o meu ídolo, Paulo Francis. Fiz pelo menos três gravações com ele. As anotações sobre esta convivência estão feitas. Falta organizá-las.
Feitas as contas, resolvi quebrar o constrangimento. Não posso deixar que o medo do "name-dropping" me condene a guardar na gaveta as cenas que testemunhei ou as frases que ouvi. Pretendo, em breve, produzir um documento sobre Paulo Francis, a estrela máxima do jornalismo brasileiro das últimas décadas.
Quando o assunto é Paulo Francis, considero-me um grande devedor. Os maiores elogios que recebi na vida foram feitos por ele, repetidas vezes, na coluna Diário da Corte. Quem não gosta de ser elogiado que atire o primeiro Prozac. Fora das páginas de jornal, fui alvo de pelo menos uma demonstração de extrema generosidade que Francis praticou sem qualquer interesse.
Em nome dos teclados de São Gutemberg, prometo à minha dezena de leitores: os fãs, os órfãos, os detratores de Paulo Francis ganharão um presente que estou, aos poucos, garimpando. Que ninguém se assuste, porque não cairei na tentação de parir um tratado sobre o homem. Praticarei o exercício básico do jornalismo: publicarei o que vi e ouvi. Ponto. Reproduzirei diálogos entre Francis e grandes feras. Vai ser minha maneira de retribuir os presentes que ganhei. A retribuição virá em forma de livro. É projeto para 2008.
Por ora, pergunto: o que diabos vocês estão fazendo aí? Por que não saem voando para conseguir uma cópia de "O Afeto Que se Encerra" ? É um dos melhores livros de memórias já lançados no Brasil. Autor: Paulo Francis. Uma nova edição acaba de sair do forno da Editora Francis.
O Sopa de Tamanco fará, nos próximos dias, uma seleção de frases marcantes do livro, para animar os preguiçosos.
Além do relançamento de "O Afeto que se Encerra" , há outra boa notícia no arraial: Sônia Nolasco, viúva de Francis, resolveu publicar o romance inédito que ele não teve tempo de lançar.
Às favas com a objetividade jornalística: nem li. Mas já gostei.
Texto na seção Reportagens::
http://www.geneton.com.br/archives/000083.html
aqui, a entrevista:
http://www.geneton.com.br/mt/mt.cgi?__mode=view&_type=entry&id=230&blog_id=1&saved_added=1#
ARIANO APONTA OS NOMES QUE, SEGUNDO ELE, MERECEM IR PARA O TRONO DA CULTURA BRASILEIRA
Autor de um dos mais belos livros publicados nas últimas décadas no Brasil, o imerecidamente pouco conhecido ''Romance da Pedra do Reino'', o escritor e dramaturgo Ariano Suassuna vem se dedicando a uma grande tarefa. Em nome da defesa da cultura brasileira contra a infiltração do ''lixo cultural'' despejado goela abaixo de países satélites como o Brasil, Ariano vem se dedicando a uma cruzada solitária em defesa de manifestações da criatividade popular.
O cruzado Ariano se esquece até de que tem horror a viajar. Há pouco tempo,foi parar no Rio Grande do Sul, para dar uma ''aula-espetáculo'' - uma façanha digna de registro, na biografia de um homem que se contenta em ver aviões em fotografias. Segunda tarefa: conhecido como autor do ''Auto da Compadecida'', texto teatral que virou até filme dos Trapalhões, este sertanejo da Paraíba radicado há décadas no Recife pretende lançar em breve um livro em que simplesmente recria e reescreve tudo o que já' produziu na vida.A tarefa se arrasta há anos. Não é para menos. Nesta entrevista, além de acusar de ''equivocados'' os que defendem a abertura dos portos ao ''lixo cultural'' estrangeiro, ele faz uma lista dos artistas e escritores que, segundo ele, realmente representam o Brasil.
O chamado ''gosto médio'', a que o senhor se refere com desprezo, é' ''pior do que o mau gosto''. Quais são, na produção cultural brasileira de hoje, os piores exemplos da vitória do ''gosto médio'' sobre a qualidade artística ?
ARIANO SUASSUNA : '' O gosto médio a que me refiro é ligado àquele mesmo lixo produzido pela indústria cultural de massas. É fácil identificar na produção cultural brasileira de hoje quem segue tais padrões ou com eles se acumplicia''.
Há quem diga que quem defende a preservação da chamada ''arte popular'' defende, na verdade,a manutenção da pobreza. Porque, se conseguissem vencer a pobreza e se tivessem acesso à educação, os artistas populares certamente deixariam de produzir obras formalmente rústicas e primitivas. O que o senhor diz a estes críticos ?
ARIANO SUASSUNA : "Digo, em primeiro lugar, que se realmente a opção fosse esta eu não teria dúvida : seria melhor que a injustiça desaparecesse, mesmo que a Arte popular desaparecesse com ela. Mas acontece que este é' somente um sofisma, criado por por pessoas que, na verdade, detestam as manifestações populares da nossa Cultura. Em segundo lugar, eu gostaria de refutar o lugar-comum segundo o qual as obras criadas no âmbito na Arte popular são necessariamente rústicas e primitivas quanto à forma. Veja-se, por exemplo, a seguinte Décima que poderia ter sido escrita por Calderon de la Barca - e é' do cantador Dimas Batista :
Na vida material
cumpriu sagrado destino :
o Filho de Deus, divino,
nos deu glória espiritual.
Deu o bem, tirou o mal,
livrando-nos da má sorte.
Padeceu suplício forte,
como o maior dos heróis.
Morreu pra dar vida a nós :
a vida venceu a morte.
Ou então esta,que Mallarmé assinaria :
No tempo em que os ventos suis
faziam estragos gerais,
fiz barrocas nos quintais,
semeei cravos azuis.
Nasceram estes tafuis,
amarelos como cidro.
Prometi a Santo Izidro,
com muito jeito e amor,
leva-los, quando lá for,
em uma taça de vidro.
Assim, caso os Poetas, hoje populares, recebessem educação universitária, o que poderia acontecer é que passassem todos a compor seus versos com o rigor das duas Décimas citadas. Não acredito que o Povo pobre do Brasil perdesse a força criadora caso melhorasse de vida. Melhorou, na China - e nem por isso o Teatro nacional e popular chinês desapareceu ou piorou. Pelo contrário. Ou, para falar em termos brasileiros: J. Borges é um grande gravador popular. Se tivesse tido formação ''erudita'', continuaria a ser o grande artista brasileiro que é, somente tratando seus universos pessoais e peculiares com o rigor formal de um Gilvan Samico''.
Quem é, afinal, para o senhor,o artista que, em qualquer área de produção cultural brasileira, melhor representa o Brasil ?
ARIANO SUASSUNA : ''Artes plásticas : Aleijadinho, Francisco Brennand e Gilvan Samico. Artes cênicas : Antonio José da Silva, o Judeu; Martins Pena, Qorpo Santo e Artur Azevedo. Literatura : Euclydes da Cunha, Augusto dos Anjos. Música : José Mauricio Nunes Garcia, Villa-Lobos, Guerra Peixe, Ernesto Nazaré, Capiba e Antônio José Madureira. Védeo e cinema : Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Vladimir Carvalho, Guel Arraes e Luiz Fernando Carvalho''.
O senhor reclama de que ''o patrocínio de multinacionais nos eventos é uma tentativa de adormecer a resistência de nosso povo e aviltar a cultura brasileira pelo suborno dos intelectuais''. Quais são os patrocínios ou promoções que o senhor considera exemplos de ''tentativas de suborno'' ?
ARIANO SUASSUNA : ''Recusei indicações para o Prêmio Shell e para o Sharp. Recusei-me a participar da Bienal Nestlé de Literatura. Não fui eu que passei a notícia das recusas para os jornais, porque não fiz isto para me exibir nem para incorrer em falta de fraternidade com escritores e artistas que não têm as mesmas idéias nem as mesmas condições que eu tenho. Tais condições me deixam à vontade para recusar. Por isso, peço licença para, de uma vez por todas, encerrar aqui este desagradável assunto''.
Se a cultura é inevitavelmente afetada pela economia, não é ingenuidade querer que manifestações culturais brasileiras sejam preservadas numa espécie de redoma à prova de influências externas, numa época em que as relações econômicas sofrem um processo radical de internacionalização ?
ARIANO SUASSUNA : ''Colocar a Cultura brasileira numa redoma, além de ser uma coisa impossível, é algo de absolutamente indesejável. Faz muito tempo que venho fazendo afirmações em tal sentido. Por exemplo : no dia primeiro de dezembro de 1963, publiquei no jornal ''Última Hora'' um artigo no qual dizia que ''a Arte que se tornasse uniforme não se tornaria mais pura, tornar-se-ia, isto sim, mais pobre''. Depois, em 1974, ao reunir as ideias centrais do Movimento Armorial, eu afirmava que, ao valorizar o tronco negro, indígena e ibérico da nossa Cultura, não estávamos esquecidos de outras etnias e manifestações culturais que também são importantíssimas para o Brasil. Tomávamos tal posição por estarmos convencidos de que somente fortalecendo aquele tronco cultural é que qualquer coisa que nos venha de fora passa a ser, em vez de uma influência que nos esmaga e nos massifica num cosmopolitismo achatador e monótono, uma incorporação que nos enriquece.
O que não posso aceitar é que brasileiros equivocados queiram que, em nome de nossa bela e fecunda diversidade, aqui seja acolhido também o lixo cultural que é sub-produto da indústria cultural americana espalhado pelo resto do mundo como se fosse coisa tão importante - e até mais importante - do que os romances de Faulkner. Ou seja: não tenho nada contra Melville. Mas não é possível que queiram exigir que eu ache que Michael Jackson e Madonna tem a mesma importância que Melville ou Euclides da Cunha. Quero deixar claro que tenho pelo ''lixo cultural'' brasileiro horror igual ao que tenho por qualquer outro''.
Se tivesse de escolher entre passar um fim de semana passeando com Woody Allen pelas ruas de Manhattan ou cavalgando com um vaqueiro pelos morros do sertão da Paraíba, com qual dos dois o senhor ficaria ?
ARIANO SUASSUNA : ''Passear por Manhattan, com Woody Allen ou com qualquer pessoa de tal tipo, é coisa que, para mim, não representa qualquer atrativo. Nunca saí do Brasil, mas, já que estamos no terreno das hipóteses, por que você, que é meu amigo, não pensa em alguém melhor e num lugar melhor? Quanto à outra alternativa, não tenho mais a resistência para sair por aí afora cavalgando pelos morros do sertão da Paraíba''.
O senhor não acredita que manifestações culturais e artísticas de um povo possam absorver criativamente influências externas ? Um violeiro que vê televisão não pode se enriquecer com as novas informações que recebe ?
ARIANO SUASSUNA - Qualquer um de nós pode se enriquecer com as novas (e boas) informações que recebe. Eu leio jornais e vejo televisão. Os cantadores e violeiros nordestinos também. Nenhum de nós perde, com isso, a garra brasileira e o senso crítico e satírico. Pelo contrário. Ouvi recentemente o cantador nordestino Edmílson Ferreira comentar assim, num Martelo-de-Seis-Linhas, as desventuras conjugais da família real inglesa :
Na Inglaterra,as coisas andam feias,
todo mundo por lá endoidecendo.
Toda dia é uma princesa sem marido,
ou um príncipe que, só,fica vivendo.
Ou a carne de vaca fez efeito,
ou o chifre do boi está fazendo.
Qual é a pior doença e qual é a melhor cura para o Brasil de hoje, às vésperas do ano dois mil ?
ARIANO SUASSUNA : ''Machado de Assis fez uma distinção definitiva entre o Brasil oficial e o Brasil real que, a meu ver, é o do Povo, o do ''Quarto Estado''. As maiores doenças nossas têm origem no Brasil oficial e a cura só lhe pode vir do Brasil real. As pessoas que sustentam idéias diferentes das nossas parecem pensar: ''O Brasil oficial é o problema; na Europa e nos Estados Unidos está' a solução''. Eu acho que o Brasil oficial é o problema, no Brasil real está' a solução '' .Ou,um pouco à moda de Unamuno: ''Brasil é o problema, Brasil é a solução''.
O senhor ainda reclama das guitarras elétricas. Isto não é uma discussão superada desde os anos sessenta ?
ARIANO SUASSUNA : ''Vou mais longe, até: esta é uma discussão que não tem o menor interesse - e desde muito antes. Nem nos anos sessenta ela fez parte das minhas preocupações. Em música, gosto de Monteverdi, Vivaldi, Scarlatti, Stravinsky, Erik Sati, José Mauricio Nunes Garcia, Joaquim Emérico Lobo de Mesquita, Villa Lobos, Guerra Peixe ou Antonio José Madureira. Quando vão me entrevistar, fazem-me pergunta sobre guitarra elétrica, Michael Jackson e Orlando Silva. É' por isso que apareço falando sobre assuntos ou pessoas sobre as quais não tenho o menor interesse. Nunca me viriam à lembrança - se não me fizessem tais perguntas''.
O senhor diz que não tem interesse pela obra de compositores da MPB, como Caetano Veloso e Gilberto Gil, porque eles são influenciados pela ''massificação cultural americana''. O senhor não reconhece na obra de compositores como estes nenhuma contribuição para a modernização da música popular brasileira ?
ARIANO SUASSUNA : ''Por iniciativa minha, jamais fiz qualquer referência a Caetano Veloso e Gilberto Gil. As pessoas que me entrevistam é que fazem perguntas a respeito deles e de outros. Depois, na maioria dos casos, quando publicam as matérias, ficam me acusando de radical e intolerante por causa das respostas que dou, porque não costumo esconder nem disfarçar o que penso. Quanto a mim, não gosto de estar falando mal de nenhum companheiro de trabalho, principalmente quando se trata de pessoas que antes estavam do nosso lado e depois passaram a emprestar seu talento ao outro''.
O senhor, secretario de um governador - Miguel Arraes - que se declara intransigentemente nacionalista, gostaria de ser ministro de um presidente neo-liberal ?
ARIANO SUASSUNA : ''Sou amigo do governador Arraes, mas só concordei em ser Secretário porque acho que ele representa, no campo da Politica brasileira, o mesmo que eu procuro ser no campo da Cultura. O convite foi honroso. O cargo tem me trazido muitas e ardentes alegrias. Mas está me obrigando também a fazer coisas que detesto - como, por exemplo, viajar. Imagino o que não aconteceria como Ministro, motivo pelo qual não gostaria de exercer tal cargo com nenhum Presidente, neo-liberal ou não. Eu teria até de me mudar para Brasilia, o que, para mim, seria uma verdadeira catástrofe. Felizmente, pertenço à oposição. Não existe qualquer perspectiva a tal respeito; de modo que não vou me preocupar com a possibilidade colocada na pergunta''.
Como se chama e do que tratará o livro que o senhor vem escrevendo há anos ? Que impacto o senhor gostaria que este livro tivesse no meio literário brasileiro ?
ARIANO SUASSUNA : '' O livro,ainda sem título, é um romance que, se for concluído como pretendo, será uma espécie de revisão e recriação de tudo o que escrevi. Terminará a historia que comecei a narrar com ''A Pedra do Reino''. Quanto ao ''impacto'', não tenho nenhuma originalidade : gostaria que o livro tivesse boa aceitação de público e de crítica. Mas, infelizmente, tenho consciência de que sou um escritor de poucos livros e de poucos leitores. Já me darei por muito feliz se meu corajoso editor não tiver prejuízo''.
Se um violeiro procurasse o senhor com uma guitarra ,o que é que o senhor faria ?
ARIANO SUASSUNA : ''Um violeiro com uma guitarra na mão seria aquilo que, em Lógica, se chama uma contradição em seus próprios termos : ele não seria mais um violeiro e sim um guitarrista. E provaria, com a nova opção, que nem como violeiro ele prestava. Mas só estou respondendo porque, como se diz nos depoimentos judiciais, com grande alivio meu e dos leitores, chegou a hora do "nada mais disse nem foi perguntado''.
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1996
Já se disse que a realidade brasileira supera, com folga, a ficção. É verdade.
Um piloto - que um dia se tornaria escritor - recebe uma ordem: bombardear, pelo ar, o Palácio do Governo. O bombardeio tinha até hora marcada: seis da manhã. O governador estava lá dentro. Ia tudo virar pó.
Nome do piloto :Oswaldo França Júnior. Nome do governador : Leonel Brizola.
(Aqui, o depoimento completo de França Júnior sobre a aventura:
http://www.geneton.com.br/archives/000076.html)
Um ex-editor do jornal The Times, um dinossauro chamado Louis Heren, disse que ouviu, no início da carreira, um conselho inesquecível de um chefe.
O conselho - de fato - é perfeito para quem exerce o jornalismo:
"Quando estiver ouvindo presidentes e ministros, líderes sindicais e empresários, iogues e delegados, o repórter deve sempre perguntar a si próprio: por que será que estes bastardos estão mentindo para mim ?".
Eis aí o melhor manual de redação já escrito.
Deve ser verdade, porque ninguém desmentiu a notícia: Ivete Sangalo cobrou um cachê de seiscentos mil reais para cantar numa festa de peões no interior de São Paulo. Seiscentos mil. Não houve acordo, claro.
Se Beethoven fosse vivo, certamente ficaria satisfeito com um cachê de trinta e cinco mil reais.
Não confie nunca, jamais, sob hipótese alguma, em gente que começa uma frase com "veja bem" ou interrompe-a com a palavra "minto" a cada vez que comete um engano qualquer. É gente capaz de passar cheque sem fundo, dar cascudo em recém-nascido, palitar dente em restaurante, cheirar vinho e,pior, cantar em sarau balançando o corpinho de um lado para o outro com um copo de cerveja na mão.
O fenômeno foi cientificamente comprovado.
Se o Brasil fosse realmente uma democracia, todo cidadão, independentemente de cor, credo religioso, estado civil e grau de instrução, teria o direito de dar voz de prisão aos redatores dos discursos de senadores larápios, a publicitários autores de anúncios supostamente engraçadinhos e a todo ser vivente que alguma vez na vida tenha cantado aquela musiquinha do "me leva, amor/ por onde for, quero ser seu par" em saraus na areia.
Neste dia histórico, em que o blog Sopa de Tamanco completa um mês no ar, nosso Departamento de Estatísticas informa:
o número de visitantes do Sopa de Tamanco já supera, em muito, o do Museu do Índio ( rua da Palmeiras, 55, Botafogo, Rio)!
O Museu do Índio recebe de trinta a quarenta visitas por dia ( acabamos confirmar, por telefone).
Não queremos decepcionar os admiradores, parentes e amigos dos nossos caros silvícolas, mas
trinta visitas é o que o Sopa de Tamanco recebe por hora!
Ou seja: mal foi criado, o Sopa de Tamanco já supera, com folga, o Museu do Índio.
Quinhentos anos de história se evaporaram num piscar de olhos.
Nosso Departamento de Estatísticas oferecerá, em breve, novos números ( reais e confiáveis) para que nossos ilustres visitantes possam se orientar e evitem cair nas malhas da propaganda enganosa.
Tarde de ensaio na banda de música loca, numa cidadezinha do interior. O suarento maestro dirige-se a uma senhora, gorda e compenetrada, que parecia entendiadíssima em sons e harmonias:
-A senhora toca ?
-Só um instrumento de sopro : café quente.
Joel Silveira, datilografado por GMN
O mal de Deus é que ele exagera muito quando quer agradar a alguém.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Quem se habilita a fazer uma lista das perdas e danos provocados pela disseminação da praga politicamente correta ?
Eu me arrisco a apontar uma : a universidade - que já era uma porcaria - vai virar um lixo.
Em nome da idéia de corrigir injustiças históricas, um débil mental teve a grande idéia de eleger a cor da pele como indicativo de mérito acadêmico. Ou seja: quem se declarar preto terá prioridade sobre quem for de outra cor, na hora de tentar conquistar ua vaga na universidade.
Há um milhão de outras maneiras de tentar estancar a chamada "exclusão social". Mas os gênios escolheram a mais errada de todas.
Agora, os jornais anunciam que o governo do Estado do Rio vai garantir uma cota nas universidades para filhos de policiais mortos.
O que é que uma tragédia familiar tem a ver com mérito acadêmico?
Ah, a indomável vocação do Brasil para se perpetuar como republiqueta...
O falecido David Nasser certa vez me contou:
-O Chatô ( Assis Chateaubriand) chegou um dia para mim e disse :"Saiba vossência que jornalista que não enriquece é burro! Aprenda isso, turco!".
Lembro a historinha, somo e peso meus haveres e concluo: sou uma besta, e das mais quadradas, sem direito sequer a renovar as velhas ferraduras.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Preparem os estômagos. Respirem fundo. Acendam uma vela para Nossa Senhora do Perpétuo Espanto, nossa padroeira.
Depois da capa da "Veja" com novas denúncias, começa esta semana uma nova temporada de explicações inexplicáveis do presidente do Senado.
Mais chato que a tal da Bossa-Nova, com seus cicios e corrimentos,só deve ser o Purgatório, que também não ata nem desata. Só enche.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Fábio Júnior, aquele cantor que gosta de tirar foto descalço e com um copo de uísque na mão, continua solto ?
Saudosistas de John Lennon, correi. Acaba de sair um belo disco : "Make Some Noise".
É uma daquelas coletâneas benemerentes mas vale a viagem : artistas regravaram as melhores canções de John Lennon,num álbum duplo lançado pela Anistia Internacional em prol das vítimas da carnificina de Darfur, no Sudão.
Duas regravações : "Mother" - talvez a melhor música de JL - e "Real Love". Em "Mother", John Lennon resume em duas linhas toda a história da psicanálise: "Mother,don´t go/ Daddy,come home" ("Mãe, não vá embora/ Pai, venha para casa"). A mãe de Lennon, como se sabe, morreu atropelada por um policial bêbado.O pai sumiu. Só reapareceu quando o filho já era famoso.
A letra de "Mother":
"Mother, you had me but I never had you,
I wanted you but you didn't want me,
So I just got to tell you,
Goodbye, goodbye.
Farther, you left me but I never left you,
I needed you but you didn't need me,
So I just got to tell you,
Goodbye, goodbye.
Children, don't do what I have done,
I couldn't walk and I tried to run,
So I just got to tell you,
Goodbye, goodbye.
Mama don't go,
Daddy come home.
Mama don't go,
Daddy come home".
O Sopa de Tamanco atende a pedidos vindos de todas as partes desta sala: repete o post com o poeta Allen Ginsberg, um dos papas da geração beat. O poema é "Father Death Blues". Ginsberg escreveu a bordo de um avião, a caminho do enterro do pai. Depois, musicou. É melhor ouvir Ginsberg recitando "Father Death Blues" do que assistir a comerciais da Casa & Vídeo sobre o dia dos pais.
Hey Father Death, I'm flying home
Hey poor man, you're all alone
Hey old daddy, I know where I'm going
Father Death, Don't cry any more
Mama's there, underneath the floor
Brother Death, please mind the store
Old Aunty Death Don't hide your bones
Old Uncle Death I hear your groans
O Sister Death how sweet your moans
O Children Deaths go breathe your breaths
Sobbing breasts'll ease your Deaths
Pain is gone, tears take the rest
Genius Death your art is done
Lover Death your body's gone
Father Death I'm coming home
Guru Death your words are true
Teacher Death I do thank you
For inspiring me to sing this Blues
Buddha Death, I wake with you
Dharma Death, your mind is new
Sangha Death, we'll work it through
Suffering is what was born
Ignorance made me forlorn
Tearful truths I cannot scorn
Father Breath once more farewell
Birth you gave was no thing ill
My heart is still, as time will tell.
O site da BBC Brasil informa:
"Novo recordista de pula-pula aquático:
O novaiorquino Ashrita Furman marcou dois novos recordes aquáticos: o de pula-pula e o de bambolê debaixo d'água. Ele percorreu o equivalente a cerca de 512 metros no fundo da piscina com o pula-pula e rebolou com o aro durante 2 minutos e 38 segundos"
Um vídeo com o feito do sr. Furman pode ser visto no site http://www.bbc.co.uk/portuguese/
Passar 2 minutos e 38 segundos fazendo bambolê no fundo de uma piscina.
Só uma coisa pode ser mais inútil: escrever para blogs.
Mas todos escrevem.
E o senhor Furman rebola.
O show não pode parar.
É pule de dez : tenho certeza de que, assim que alguém pisa no inferno, a primeira coisa que ouve é aquela música "quero a risada mais gostosa" etc.etc, cantada por Ivan Lins. Sentado num trono, todo vestido de vermelho, com um tridente na mão e um caixa de enxofre na outra, o Lúcifer ri a bandeiras despregadas. Uma TV, ligada no salão ao lado, irradia durante todo o tempo a frase "essa galerinha vai aprontar todas!". Uma diabo júnior fica repetindo em voz alta os textos de uma reportagem de revista de celebridade sobre um ganhador do Big Brother. O sistema de alto falantes propaga um anúncio engraçadinho de cerveja. A voz de um senador mentindo sobre falcatruas agrava a cacofonia. Ouve-se, claro e nítido, Roberto Carlos cantando aquele primeiro verso de "Emoções". Os sons se misturam todos, em meio a labaredas vermelhíssimas.
Tive esse pressentimento : o inferno deve ser assim.
Quando eu chegar lá, mando notícias confirmando.
Ninguém tem o direito de proclamar-se velho se ainda não começou a resmungar.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Do blog de Antonio Fernando Borges:
"Enquanto a mídia perde (ou ganha?) tempo se preocupando com bagatelas e nonadas, prefere fazer silêncio a respeito de acontecimentos editoriais efetivamente relevantes.
Entre eles, destaque total para o lançamento de uma edição brasileira de La trahison des clercs (A traição dos intelectuais), do filósofo francês Julien Benda (1867-1956). Lançado em 1927, o livro é um libelo imprescindível contra a adesão dos intelectuais às paixões políticas, em detrimento de seus verdadeiros compromissos com os valores superiores - como a verdade, a razão e a justiça.
Confiram a data original: o livro chega ao Brasil nada menos do que com 50 anos de atraso. Mesmo assim, não poderia ser mais oportuno e atual. Um instrumento de reflexão do calibre de um La rebelión de las masas, de Ortega y Gasset, que teve melhor sorte entre nós. Ponto para a novíssima editora paulista Peixoto Neto, que tomou para si a empreitada.
Lidos em conjunto, Ortega e Benda ajudam a compreender por que nossos intelectuais fazem algazarra por nada, enquanto sintomaticamente silenciam diante do essencial"
(aqui: http://www.antoniofernandoborges.com/)
Nunca esqueci aquele final de Caetés - de Graciliano Ramos:
"Ateu! Não é verdade. Tenho passado a vida a criar deuses que morremlogo, ídolos que depois derrubo : uma estrela no céu, algumas mulheres na terra".
Bonito de arrepiar.
Joel Silveira, datilografado por GMN
Cole o ouvido no chão, como se fosse índio. Disfarce, para não dar vexame no meio da rua. Faça de conta que tropeçou. Agora, apure ao máximo o sentido da audição. Assim. Você ouvirá um rumor claro e nítido transmitido por ondas sonoras que se espalham pelo chão. É o suspiro de tédio exalado pelo território do Brasil a cada impostura senatorial ou palaciana :"Ufa...."
Olhe para as nuvens. Tente decifrar o que elas estão dizendo. Veja ali : a confluência daquelas três nuvens forma,obviamente, uma palavra. Só um cego não vê: "Ufa...."
Agora, tente entender o sinal secreto enviado pela poça d´água na esquina de casa. O desenho formado pelas três folhas secas que boiam sobre a poça diz: "Ufa..."
Desde a manhã de hoje, leio em todos os lugares a palavra mágica :"Ufa"....
Dizem que o mero vôo de uma borboleta no outro lado do mundo pode deflagrar uma série incontrolável de acontecimentos em cadeia.
Há uma corrente invisível unindo os fatos. Basta prestar atenção.
O que me fez enxergar a palavra "ufa" no chão, nas nuvens, na poça d´água foi uma notícia lida no jornal.
O PDR ( Presidente da República, criemos logo outra sigla) teria chamado de "hipócritas" dois senadores bons de briga que estão peitando o presidente do Senado ( aquele que vive fazendo malabarismos com a máquina de calcular na mão).
"Hipócritas".
Ufa....
Os praticantes de nado sincronizado continuam soltos ?