"A ARTE É JOGAR BOLA" - DISSE O SAMBISTA. ENTÃO, "TUDO EM CIMA NOVAMENTE" COM A "TORCIDA CAMPEÃ"
Fui uma vez na vida ao Sambódromo do Rio de Janeiro para ver o desfile das escolas de samba. Ano: 1986. Recém-chegado ao Rio, fui matar a curiosidade de ver o espetáculo "ao vivo e a cores". Valeu o ingresso. Vi um show de bola.
Desde então, em toda Copa do Mundo eu me lembro da cena bonita: a Beija-Flor fazia um desfile em homenagem à paixão brasileira pelo futebol. Desabou um temporal daqueles logo antes do desfile. Ensopado, todo de branco, Joãozinho Trinta - o que apostava na alegria - comandava a festa.
Era ano de Copa. Os versos cantados por Neguinho da Beija Flor falavam em "sonho triunfal", saudavam a "torcida campeã", celebravam "os heróis da nossa Seleção", diziam "tudo em cima novamente" e terminavam com uma conclamação: "Vai na Copa e faz um carnaval".
Debaixo da chuva, ex-craques da Seleção acenavam para a torcida - que delirava, num Sambódromo temporariamente transformado num Maracanã para celebrar a alegria do futebol. Bonito, bonito, bonito.
Eu me lembro de ter visto Carlos Alberto - o capitão da seleção campeã de 70 - e Jairzinho desfilando em cima de carros alegóricos sob aplausos gerais. Era um pequeno momento de glória e congraçamento entre craques e a torcida - exatamente o que acontece, numa escala maior, é claro, em cada jogo de Copa do Mundo.
Confesso: eu - que sempre acompanhei à distância o espetáculo do samba - tive, ali, uma recaída braba de "brasilidade". Ali estavam, irresistíveis, duas belíssimas manifestações populares brasileiras: o samba e o futebol. Devo ter pensado, numa crise de patriotada: em que outro lugar se vê algo assim? Logo eu - tão íntimo de samba quanto um marciano recém-desembarcado no planeta.
Ficaram na memória: a chuva desabando sobre o Sambódromo; a arquibancada cantando em peso "Brasil, Brasil, Brasil canta forte e explode de alegria/ o mundo é uma bola/ girando/ girando / em plena euforia / (...) com os heróis da nossa seleção vibrantes com o grito popular"; craques que pareciam saídos de álbuns de figurinhas acenando para a torcida; o som da bateria explodindo no ar; Joãozinho Trinta erguendo os braços para levantar a torcida.
Um verso do samba-enredo resumia tudo, valia por dez teses sobre o caráter nacional: "A arte é jogar bola". Não por acaso, em tempos de Copa do Mundo sempre me lembro do que vi ali, naquela noite.
A "arte" de "jogar bola" é uma contribuição brasileira à alegria.
A Seleção vai bem na Copa de 2014? É claro que não.
Se ficar de fora, aliás, não será o fim do mundo.
Mas não sou "espírito de porco". Quando o Brasil entra em campo, como daqui a pouco, é hora de lembrar o coro da arquibancada do Sambódromo:
"Tudo em cima novamente / oh, torcida campeã".
Aqui, o samba enredo que celebra o futebol: