julho 20, 2014

DUAS CENAS RÁPIDAS COM DUNGA

É hora de lembrar duas cenas rápidas com Dunga - ao que parece, o novo técnico da Seleção Brasileira.
A primeira aconteceu em Londres, 1995. A Seleção Brasileira ia fazer uma amistoso contra a Inglaterra. Fui ao hotel para tentar uma entrevista. A tietagem era grande na calçada. Afinal, aquela era a seleção campeã do mundo.
Entre a saída do hotel e o ônibus que os conduziria a um treino, os jogadores eram abordados por fãs em busca de autógrafos ou uma foto ( não havia "selfies" ainda...). Uma lembrança boba: Zinho passou direto, sem se dar ao trabalho de atender aos "fãs". Havia ingleses e brasileiros.
Pouco antes, Dunga - o capitão - tinha nos recebido na recepção do hotel. Deu, pacientemente, uma entrevista em que rememorou os grandes momentos da Copa.

Eu me lembro da descrição forte que ele fez do momento em que se preparava para bater o pênalti na decisão do título contra a Itália. Disse que, ao se dirigir à marca do pênalti, parecia que tinha ficado cego e surdo: era como se não estivesse vendo nem ouvindo nada no estádio - tal a tensão. Quando viu a bola estufar a rede, sentiu que um peso de uma tonelada lhe saíra dos ombros.
Meu filho - à época com três anos - me acompanhava. Dunga posou para uma foto com ele. Terminada a entrevista, o capitão de Seleção disse: "Espere aí!". Deixou o local da gravação, subiu ao quarto, voltou com vários posters e cartões postais - autografados. Fez tudo com toda boa vontade.
( a bem da verdade, houve outra cena : uma vez, Dunga veio de Porto Alegre para o Rio para participar de uma gravação para o Fantástico. Ficou sentado, sozinho, num canto da redação, enquanto não era chamado para o estúdio. Peguei meu velho gravador, levei para uma sala, perguntei se ele toparia uma entrevista. Topou. Ricardo Pereira - editor do Fantástico - participou daquela "exclusiva" não programada. A entrevista nunca foi publicada. Guardei a fita. Prometo transcrevê-la).
A segunda cena aconteceu no Rio de Janeiro, no ano passado. Estava gravando o documentário "Dossiê 50: Comício a Favor dos Náufragos" - a partir das entrevistas que fiz com todos os jogadores da Seleção Brasileira da Copa de 50.
Tive uma ideia: que tal se, ao final do documentário, campeões mundiais brasileiros dissessem os nomes dos jogadores de 50? Poderia ser uma homenagem simples e bonita.
A gravação era a mais simples possível. Ninguém precisava dizer nada: bastaria olhar para a câmera e pronunciar os nomes dos onze injustiçados. Tempo estimado de gravação: uns quinze segundos. ( Jairzinho, Carlos Alberto, Zagalo, Amarildo e Ronaldo Fenômeno gravaram).
Dunga era técnico do Internacional. Fomos ao hotel de Copacabana em que a delegação se hospedaria. Preparamos o equipamento, improvisamos um pequeno "set" num canto da recepção. Depois de cerca de uma hora, chega o ônibus. Dunga desce, circunspecto.
Digo rapidamente o que gostaríamos de fazer. Pergunto: Dunga poderia olhar para a câmera e dizer os nomes dos jogadores de 50? É coisa rapidíssima. Sem diminuir o ritmo da caminhada, Dunga responde que vai jantar. Pega o elevador, sobe para o quarto, volta uns vinte minutos depois. Nosso plantão continua. Tento nova abordagem, no curto trajeto entre o elevador e o restaurante do hotel: pode ser agora? Com os olhos pregados na tela luminosa do celular, sem interromper os passos, ele repete que irá jantar - gravação agora, não. Passa direto para o restaurante. Janta, conversa longamente com os acompanhantes depois da sobremesa.
Ficamos "monitorando" o homem à distância. Resolvemos esperá-lo na porta do elevador. Cerca de uma hora e meia depois de entrar, Dunga deixa o restaurante. Faço a terceira abordagem. Dunga se senta, olha para a câmera, pronuncia a escalação da Seleção de 50: Barbosa; Augusto, Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode; Friaça, Zizinho, Ademir, Jair e Chico. Pega de novo o elevador, desaparece de vista. Aqueles míseros quinze segundos de gravação deram trabalho...Mas a causa era "nobre": a homenagem aos náufragos de 50 não ficaria completa se não contasse com a participação do capitão do tetra.
( Entre os companheiros de infortúnio naquele longo plantão, estava um talento que se iniciava em aventuras externas, longe do ar-condicionado da redação - Rodrigo Bodstein. É provável que tenha ficado ligeiramente traumatizado com o tempo gasto para tão pouco. Mas, nestes casos, o que vale não é o "tempo gasto": é o resultado conseguido.
Uma vez, em 1992, passei uma tarde na recepção de um hotel - também em Copacabana -, à espera de que o ex-secretário de Estado do governo John Kennedy, Robert McNamara, aparecesse. O homem apareceu. Quase não parou para nos atender - mas terminou falando ).
Devo dizer que o chá de cadeira que ganhei de presente de Dunga foi um dos mais memoráveis que já tomei: ao todo, cerca de três horas para conseguir quinze segundos. C´est la vie. Acontece. Nem ele tinha obrigação de me atender nem eu tinha planos de desistir.
Placar: um a um.

Posted by geneton at julho 20, 2014 12:15 PM
   
   
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