DARCY RIBEIRO : AOS OLHOS DE UMA CRIANÇA, A ESCOLA PÚBLICA É UMA CASA QUE REPRESENTA O ESTADO. ASSIM, O ESTADO TEM TODA A OBRIGAÇÃO DE OFERECER UMA ESCOLA PÚBLICA DECENTE ( VALE OUVIR O QUE ELE DIZIA: NESTE DOMINGO, ÀS 23:30, NA REPRISE DO PROGRAMA ABERT
Há mil e trezentos motivos para que o Estado ofereça às crianças do país um ensino público de boa qualidade.
Um motivo que pode até parecer singelo foi citado pelo grande Darcy Ribeiro numa entrevista ao histórico programa ABERTURA - que será reapresentada, neste domingo, às 23:30, no Canal Brasil:
aos olhos das crianças, dizia ele, a escola pública é como se fosse uma casa que representa a imagem do Estado.
( Bela e sábia constatação deste brasileiro que sonhava grandezas para o Brasil: a Escola pública precisa ser uma casa que o Estado oferece às crianças ! ).
Ao oferecer escolas precárias, o Estado estará traindo uma das necessidades mais básicas de toda criança: o de ter um teto seguro, capaz de protegê-la das intempéries da ignorância e do abandono.
Três décadas depois, a entrevista completa do genial Darcy Ribeiro vai ser reapresentada dentro da série de reprises especiais do programa ABERTURA - que, não por acaso, marcou época. Vale ver o que ele tinha a dizer.
O que Darcy Ribeiro fala não perdeu a atualidade nunca.
Em outro trecho da entrevista, Darcy Ribeiro diz que os administradores precisam ter um "certo grau de irresponsabilidade" na hora de imaginar o que deve ser feito. Não falava de irresponsabilidades destrutivas, claro, mas daquela fagulha que o fazia, por exemplo, criar os Cieps ( escolas que prometiam educação em tempo integral para tirar as crianças pobres das
ruas ) ou imaginar um Sambódromo para o Rio de Janeiro.
( Uma "nota pessoal": uma vez, tive a chance de passar uma tarde no apartamento de Darcy Ribeiro, em Copacabana. Cheguei com meu velho gravador e um punhado de fitas cassete.
Tinha ido entrevistá-lo. Quando ele falava, espalhava entusiasmo em volta.
Lá pelas tantas, voltou a dizer que se orgulhava dos fracassos que colecionara ao longo das vida. Tentara salvar os índios, tentara criar uma universidade decente, tentara fazer reforma agrária. Dizia que tinha fracassado em tudo, mas detestaria estar no lugar dos que venceram. Belos fracassos!
Depois, exclamou: "Eu não mereço morrer!". Brincava: dizia que queria ser coroado logo imperador do Brasil, para realizar seus sonhos brasileiros.
Transcritas, as palavras que ouvi de Darcy Ribeiro naquela tarde que, para mim, foi luminosa preencheram cerca de setenta "laudas" - era assim que se chamavam as folhas em que eram datilografadas as matérias que os repórteres escreviam. Darcy era caudaloso, épico, exclamativo. Pertencia à tribo de um Glauber Rocha: setenta páginas! Um pequeno trecho foi publicado na finada e saudosa edição de papel do Jornal do Brasil. Ah, a velha ditadura do espaço nos jornais e do tempo na TV!
Pretendo, um dia, publicar - quem sabe, num pequeno livro- a íntegra do que ele disse. Nunca é demais passar em revista as palavras de um brasileiro que sonhava que o Brasil poderia virar uma Roma dos Trópicos - o território de uma civilização que diria palavras novas ao mundo.
Terminada a entrevista, eu disse que ele deveria ter orgulho de ter feito - ou tentado - tanta coisa pelo Brasil. Darcy não quis concordar: calculou que teria pela frente uns dez anos de vida útil. Não era tanto tempo. Disse que trocaria de bom grado tudo o que tinha feito no passado pelo tempo de vida que o repórter, bem mais jovem, teria pela frente. Eu disse que não, a troca poderia não valer a pena. E ele insistiu que sim :se pudesse, faria a troca. Terminou me ofertando uma bela dedicatória: "Quer trocar o meu passado pelo seu futuro?" ).
Darcy Ribeiro era um cometa que emitia luzes a léguas e léguas e léguas e léguas da mediocridade. Que grande falta faz ao Brasil de hoje e ao Brasil de sempre!
Posted by geneton at dezembro 26, 2014 01:35 PM