CENAS DA VIDA REAL NA ILHA DE FIDEL & RAUL CASTRO : LAN HOUSE CLANDESTINA, LISTA DE ESPERA, CONTATOS SUBTERRÂNEOS , OLHARES DESCONFIADOS . VAI COMEÇAR A SAGA DE UM BRASILEIRO EM BUSCA DE UM SIMPLES ACESSO À INTERNET!
Fidel : ainda onipresente ( Fotos: Samarone Lima )
Samarone Lima é o nome de um jornalista que resolveu viver uma experiência radical : viajou para Cuba com bagagem mínima, pouco dinheiro – e o peito cem por cento aberto para descobrir o país sem qualquer idéia preconcebida.
“Por uma questão de limpeza ideológica, não fiz nenhuma leitura prévia sobre a realidade do povo cubano. Não busquei livros, informações na internet, revistas de esquerda, livros de turismo, coisas desse tipo” – informa o Aventureiro do Caribe.
Durante um mês de permanência em Cuba, hospedado em casas de cubanos, gastou menos de quinhentos dólares. Viajantes adeptos do conforto podem ficar boquiabertos com a quantia, aparentemente irrisória para um mês de permanência no exterior. Mas o brasileiro Samarone quis viver como se fosse um cubano.
De volta ao Brasil, acaba de publicar,por uma editora de Brasília, a Casa das Musas, o resultado da experiência: um livro de 232 páginas apropriadamente chamado “Viagem ao Crepúsculo”.
O relato de viagem não faz teoria política : é a descrição do que aconteceu com um brasileiro que se aventurou por uma Cuba que não aparece nem nos livros laudatórios nem nos discursos anticastristas ( se é que a palavra ainda se aplica à ilha).
“Eu não queria ter nem a visão turística nem uma visão engajada sobre a ilha” – explica. “Não fui a Cuba propriamente para escrever um livro. O que fiz foi uma espécie de diário de viagem”.
O resultado ? Direto do Recife, onde vive, o autor resume suas descobertas em uma frase para o Dossiê Geral: “O país vive um momento devastador”.
Nem é preciso fazer discursos. A simples descrição da saga do brasileiro Samarone em busca de um lugar onde pudesse acessar a Internet é suficiente para ilustrar o anacronismo em que a única “pátria socialista” das Américas se transformou neste início de século.
Dez anotações do caminhante brasileiro por terras cubanas :
1
“A demanda por notícias do Brasil tinha uma explicação simples: com o controle absoluto dos meios de comunicação, os cubanos – de forma geral- têm apenas uma vaga noção do que se passa no mundo. A leitura diária do Granma deixa a impressão de que a Venezuela está despontando como uma grande potência mundial, a nova vanguarda do socialismo – e os Estados Unidos podem a qualquer momento atacar a ilha”.
2
“Como a Internet é proibida, e nos poucos lugares em que é disponibilizada é muito cara, o pouco tempo disponível para usar a rede se destina à troca de e-mails com parentes e amigos”.
3
“Fui dar uma olhada no Informativo da Televisão Cubana. O apresentador lia um enorme texto de Fidel Castro, relatando a vitória da Revolução Cubana, as mudanças e avanços. Depois de meia hora de texto, perguntei a alguém se aquilo iria demorar. “Discurso de Fidel pode durar várias horas”, respondeu.
4
“Ter TV a cabo na ilha é proibido. A multa para quem for pego é de 10 a 20 mil pesos cubanos, uma pequena fortuna. O inspetor pode elevar este valor para 30 mil. Os equipamentos do proprietário são confiscados”.
5
“Lan House clandestina em Havana. Toquei a campainha. Um sujeito mudo, de identidade indecifrável, com uma barbicha à la Salsicha, do Scooby Doo, abriu a porta. Como não disse nada, entrei. À esquerda, um colchão de presídio e uma geladeira dos anos 50, desativada. O dono da Lan House mais esquisita em que já entrei na vida era um boliviano, filho de chineses, que morou no Brasil por um tempo. A sala para a Internet é a cozinha da casa, após um imenso corredor, que lembra cenário de filme de terror. Não há móveis na casa. As paredes não sabem o que é tinta há décadas. Para conseguir horário livre, era preciso agendar com três ou quatro dias de antecedência”.
6
“Fiquei sabendo que próximo à Universidade era possível acessar a Internet. O local era comandado por uma alemã. Como a demanda era muito grande, implicava numa espera de até uma semana para usar uma hora”
7
“Ninguém se atrevia a falar abertamente, sob um regime político que não permite a liberdade de imprensa, acesso à Internet ou expressão pública de descontentamento. Notei que em quase todo quarteirão tinha uma plaquinha com a sigla CDR. Em muitas, o complemento : “Comitê de Defensa de la Revolución”. Não entendi por que tantos comitês, se a revolução já é uma senhora de 50 anos. “Isso foi uma criação muito original do senhor Fidel Castro, logo após a invasão da Baía dos Porcos, em 1961. O regime conseguiu facilmente vencer os invasores, impediu um possível golpe, mas nascia uma verdadeira máquina de delação”, contou. “Isso se tornou um tormento na vida dos cubanos”.
8
“Durante todo o período em que fiquei em Havana, percebi que a presença da polícia era ostensiva, com seus pequenos carros de radiopatrulha. A abordagem aos jovens cubanos, especialmente negros, era constante. Nunca me pediram documentos”.
9
“Em uma de nossas últimas conversas, já perto de ir embora, quebrei um juramento. Perguntei o que ela achava da Revolução Cubana. “Vou ser sincera contigo.Se você perguntar a 50 cubanos se eles querem viver aqui, 48 vão dizer que querem ir embora imediatamente”, respondeu. “Para mim, não existe resposta mais forte que essa”.
10
“Ele deu um exemplo simples: “Se o governo revolucionário convoca para uma manifestação, você tem que se dirigir ao CDR de sua rua ou de seu bairro: no dia e hora agendados, você tem de estar lá. Caso contrário, sua ficha começará a ficar suja. Nem pense em ter uma ficha com problemas nesses famigerados comitês, porque sua vida se tornará um inferno bem maior do que já é”.
Posted by geneton at outubro 22, 2009 08:17 PM